A busca pela felicidade eterna. É completamente irracional esperar ser feliz o tempo todo. Francamente, não é possível nem real. Não conhecerá a alegria se não souber o que é a tristeza. Os que conseguem as maiores alturas são também os que mergulham nas profundezas.
Srta. Stacy. Anne with an “e”. 3ª temporada. Episódio 10. 25′44′’.
A recomendação é persistir. Acreditar na própria voz, ignorar quem encher o saco e persistir. Não só na escrita, mas em si mesma. A gente costuma desistir da gente muito fácil.
Rayane Leão.
Manoel de Barros
De todos os seres existentes (e os há aos milhões), o homem é apenas um. Dentre os milhões de homens que vivem na Terra, o povo civilizado que vive da agricultura é apenas uma pequena proporção. Menor ainda é a quantidade dos que, homens de escritório, ou de fortuna, viajam, de carruagem ou de barco. E, destes todos, um homem na carruagem nada mais é do que a ponta do fio de cabelo no flanco de um cavalo. Por que, então, toda esta agitação acerca de grandes homens e de grandes empregos? Por que todas as discussões dos eruditos? Por que todas as controvérsias dos políticos? Não há limites fixos, o tempo não permanece imóvel. Nada dura. Nada é final. Você não pode segurar o fim ou o princípio. O sábio vê o próximo e o distante como se fossem idênticos. Ele não despreza o pequeno, nem valoriza o grande. Onde todos os padrões se diferem, como poderá você comparar? Com um olhar ele se apodera do passado e do presente; sem tristeza pelo passado. Nem impaciência pelo presente. Tudo está em movimento, tem experiência da plenitude e do vazio. Não se rejubila no sucesso, nem lamenta o insucesso. O jogo nunca está terminado. O nascimento e a morte são iguais. Os termos nunca são finais.
Os Dilúvios de Outono, Chuang Tzu. MERTON, Thomas. A via de Chuang Tzu. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. pp- 133-134)
Uma mulher com uma dor é muito mais elegante. Ela tem um andar soberbo e instigante. Ela está disposta a fazer justiça. Por meios legais, a mudança atiça. Por meios sobrenaturais, ela enfeitiça. Uma mulher com uma dor é muito mais elegante. Perdeu a paciência para romance. Mergulhou fundo na natureza selvagem. Compreendeu os mistérios mais ocultos. Reformulou sua imagem. Se transformou em bicho. Passou a farejar o perigo. Buscou harmonia na natureza. Priorizou outros encantos e belezas. Uma mulher com uma dor é muito mais elegante. Se metamorfoseia na noite. Esquece prisões e açoites. Voa livre pela mata. Ela não mais acata. Ela ganhou asas. Resiste em qualquer lugar. Floresta, rio, montanha e mar. A mulher com uma dor. É aquela que o homem teme aproximar. É aquela que se despiu de tudo que a condicionava e passou a viver como imaginava, livre dos medos, da solidão e da carência.Ela passou a viver com a alma. Ela jurou amor e fidelidade à própria alma. E mais ninguém.
Aline Rafaela
O amor que eu acreditei ser um atalho, era um desvio planejado, obra do acaso, escolha imatura de uma juventude que se diz adulta, mas que quer mesmo é viver fantasias alimentadas na adolescência, sem nenhuma clemência pela razão sufocada no peso da existência não explicada e desacreditada. Atalhos e desvios fazem parte de uma só jornada, e não importa a idade, sempre haverá sensações de busca, de perda, abandono, lugar errado e vivências pela metade.
Aline Rafaela
(...) Os que sabem fazer fazem, os que não sabem fazer ensinam, os que não sabem ensinar ensinam aos professores, e os que não sabem ensinar aos professores fazem política. (...) O que essa frase quer dizer não é que os incompetentes têm um lugar ao sol, é que nada é mais duro e injusto do que a realidade humana: os homens vivem num mundo em que são as palavras, e não os atos, que têm poder, em que a competência última é o domínio da linguagem. É terrível, porque na verdade somos uns primatas programados para comer, dormir, nos reproduzir, conquistar e tornar seguro o nosso território. (...)
BARBERY, Muriel. A elegância do ouriço. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. pp. 56-57.
Se um dia eu precisar das redes sociais para existir,
Quer dizer que eu me perdi de mim.
Quer dizer que eu já não sei mais quem sou.
Quer dizer que estou em total desamor.
Dizem que quem não é visto, nunca é lembrado.
Deve ser por isso que existem os stories.
Eu valorizo quem se lembra só por lembrar,
De um abraço, de um sorriso, de um gesto ou um olhar.
Não, eu não preciso das redes sociais para existir,
Nem meus poemas.
Eles existem é dentro de mim.
Desde muito tempo é assim,
As palavras brotam do peito,
E quando vejo já está no papel
Ou em rascunho no celular.
É através das palavras que eu expresso
Todo amor e toda dor.
Para eu existir não preciso estar logado
Não preciso de mil curtidas.
Fazer existir dentro de si
Sem aprovação de terceiros
É um ato de coragem,
É atitude de quem jurou fidelidade a si mesmo.
Nós precisamos existir independente dos posts,
Dos perfis e dos seguidores.
A vida acontece é dentro de nós,
Estar presente no ciberespaço
Só é bom quando aprendemos a ser presentes dentro da gente.
Se um dia eu precisar das redes sociais para existir,
Devo acreditar que cheguei ao fim.
Aline Rafaela
Tião é Sebastião. Herdou o nome do pai, homem trabalhador, cor de mel, nascido em Minas Gerais em 1930. Do pai herdou o nome e a tristeza, que para essa gente preta e pobre do interior é inata. Os olhos de Tião são dispersos, viajam longe, como se ele nunca estivesse no presente. A simplicidade vem nos gestos, no jeito manso de se expressar, incapaz de fazer mal para alguém. As palavras são ditas com certa insegurança. Tião é homem de pouca informação, mas muita imaginação. Sua voz é rouca, seus cabelos e barbas brancas, revelam a idade. Um homem que cresceu em meio as violências domésticas e da vida. Violência é a palavra que define sua trajetória. Violências das mais diversas, físicas e psicológicas. Uma vez Tião me confessou que quando criança adorava matemática, mas logo depois completou dizendo manso e paciente: “mas naquela época gente pobre não estudava”. Tião não casou, não teve filhos, e ainda mora na casa que os pais deixou, há cerca de quarenta anos ou mais. Ele mora com os irmãos e uma irmã, que assim como ele tiveram uma vida sofrida. Outro dia Tião foi encontrado na rua, bêbado, sem condições de sustentar o próprio corpo. Uma sobrinha o viu naquela situação e buscou ajuda. Pensou que estivesse sofrendo um ataque cardíaco, um infarto ou derrame. Mas Tião, que tem pressão alta, bebeu dois copos de pinga no dia do seu pagamento, e a bebida subiu de tal jeito que ele não suportou. Poucos dias depois do ocorrido Tião procurou a sobrinha para se desculpar, sinal de humildade inconfundível, disse a ela que ele sentia muito pela vergonha que a fez passar e que havia tomado dois copos de pinga para ver se a dor passava, porque há anos se sente angustiado. Tião é chamado pelos familiares e conhecidos de Tiãozinho. Tião é muito sozinho. Olhos carregados de tristeza e frustrações. Olhos que olhamos em estado de contemplação e reflexão. Olhos que nos transporta para dimensões outras da vida, uma dimensão onde não há materialidade. Os olhos dele é mar e é rio. Há pessoas cujos olhos estão sempre marejados, como os do Tião, que parecem estar sempre segurando o choro, porque sabe que se deixar rolar as lágrimas podem nunca cessar e molhar todo o corpo ferido, das pernas ao coração. Quando Tião se desculpou com a sobrinha, deixou uma lágrima escapar, não que ele quisesse. Foi apenas uma lágrima teimosa que insistiu em escapar. Como Tião, há milhares dessas pessoas no mundo. E eu sempre me pergunto onde a humanidade foi parar. Sempre que olho nos olhos das pessoas é possível encontrar a verdade delas, e foram poucas as vezes que eu consegui enxergar pessoas em estado de plenitude.
P.S. “Tião não sabe, mas eu o amo!”
Aline Rafaela Lelis
Não é que eu queira vingança. Eu apenas quero justiça. Te encontrar daqui uns tempos, um ou dois anos talvez. Eu linda, vestida de ouro, pele reluzente, cabelos macios e um sorriso branco. Quero sim estar impecável. E quero que me veja com meu novo amor. Não, não pense nele. Pense em mim, meu novo amor sou eu. E quando me ver assim lindamente leve e radiante, quero que veja a mim novamente. Doce, suave e paciente. Quero que sinta essa Oxum, que hoje navega sobre águas calmas. Quero que me veja e me reconheça, e quem sabe possa você sentir lá no fundo amor. Me deixa ir com meu amor próprio e com o amor do meu novo companheiro. E se pergunte onde foi que tudo acabou. Quero que saiba só de olhar; que para “nós” não haverá mais chance, e sinta o que eu senti quando você disse disse é o fim. Que a sua consciência do fim o faça ir na lua e voltar por um segundo. Depois vá tomar uma bebida forte e continuar fingindo que eu não faço falta na sua vida pelo resto dos seus dias.
Aline Rafaela
(Fragmentos em papel toalha, Out/2016)