Viver é ser outro. Nem sentir é possível se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir - é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida. Apagar tudo do quadro de um dia para o outro. Ser novo com cada nova madrugada, numa revirgindade perpétua da emoção. Isto, e só isto, vale a pena ser ou ter, para ser ou ter o que imperfeitamente somos. Esta madrugada é a primeira do mundo".
PESSOA, Fernando. Livro do Desassossego.
Já se pode ver ao longe Ana chegando sorridente Em qualquer lugar do mundo Por onde ela for Algo vai mudar. Ana é muda, muda de tomate: alimento Ana é muda, muda de rosa (vermelha): encanto Ana é mundana: pós-moderna O mundo de Ana é segredo e liberdade Ana é pra ser vista, ser lida. (Ela já é colorida) Seus adornos e seu teto são de crochê, azul-amarelo-rosa-bebê Ana sabe ver o mundo do ângulo mais bonito É infinita de amor Sensível de alma Linda por natureza Ana é dente, cabelos, sorrisos Seus olhos curiosos não tem nada de inocente, Embora carregue consigo algo que indica pureza Enfim, Ana é Ana De trás pra frente, de frente pra trás E até do Avesso. Sua sensibilidade não chega a ser analfabeta. Pelo contrário, Ana sabe o que diz. E diz o que sente.
Dedicado à minha amiga Ana Paula Comissário.
Escrito em novembro de 2010.
Olha moço, com todo o respeito que tenho pela sua pessoa, o seu caso de amor é uma história de esperança. Gostar de quem não gosta da gente é no mínimo insanidade. Mas acontece. E pelo que vejo, você espera pacientemente por essa moça. Isso é bonito. Quem dera eu tivesse alguém para pensar. Tenho andado cética em relação ao amor e construído barreiras que impedem qualquer um de buscar meus olhos. No fundo, queria ser essa moça, que é amada em silêncio e nem te leva em consideração. O amor silencioso é o mais belo. É aquele que espera o tempo da pessoa amada, não importando que esse tempo seja eterno. E eu moço, embora não ame ninguém, tenho aprendido a gostar de mim, mais do que convém.
Para F. L.
Aline Rafaela
O que me irrita nela não é o cabelo que nasce do meio certinho da testa em formato “v”. Nem o scarpin que ela usa desnecessariamente todos os dias para ir trabalhar. Não, ela não é advogada ou juíza. Talvez até quisesse ser. O que me incomoda nela, não é a maneira como ela conversa com a filha e o marido ao telefone: “Oi filhinha! Como foi a aula de espanhol?”, “Amor, comprou o livro do Percy Jackson para nossa filhinha?”.
O que me irrita nela, não é ela em si. Sou eu e as memórias que tenho de mulheres como ela.
Algumas mulheres brancas me remetem à opressão, à decepção de ainda criança entender que algumas mulheres, que só pela cor (branca), cabelos (lisos e loiros) e corpo (magro) serão ouvidas e gentilmente tratadas, e, de quebra, essas mulheres trazem consigo um relativo poder de fala, de imposição através do corpo, de olhos desdenhosos cheios de vantagem e desprezo por outras mulheres diferentes dela.
A mulher a quem me refiro traz na atitude, a branquitude vestida de sonsa e a vantagem de ser branca vestida de vítima. A razão eloquente proveniente da fala mansa e gestos que dão a entender nas entrelinhas “não gosto de ser contrariada”, e o olhar fuzilante quando nota na outra (mulher/alteridade), postura, competência e autoridade.
Nesse momento é que a atitude (branquitude) da mulher dá lugar à fragilidade que tem todo ser em vantagem de poder, o medo de um dia ter que dividir esse poder e aceitar que ela não é, nunca foi e nunca será o centro do mundo.
Aline Rafaela Lelis
A minha boa educação me custa caro. Não querer parecer ser grossa ou indelicada foi uma das piores coisas que pude assimilar ainda muito nova. É como se mulheres não pudessem agir assim, porque não corresponde exatamente a um ideal feminino. Afinal, as mulheres devem ser sempre polidas e delicadas, porém nunca ríspidas. Mesmo quando for necessário para dizer para um homem de forma convincente que não estamos interessadas. De agora em diante, toda relação com o sexo oposto será esclarecida (de forma direta e rígida), em qualquer ambiente que seja, para não correr o risco de confusão entre disponibilidade e boa educação.
Aline Rafaela
"El amor es histórico y siempre es simbólico. Existe como imaginario, como literatura, como ideología, como normas, como política. Como cada quien realiza el amor dependerá del momento de la historia que vive y de sus condiciones de vida. Aprendemos ideologías amorosas, aprendemos los contenidos específicos del amor a través de los mandatos, de normas, de creencias. Al vivir, cada persona trata de realizar el amor ideológicamente aprendido. En la realidad, la mayoría vive frustraciones amorosas, porque casi nunca podemos realizar el imaginario amoroso al que estamos vinculadas."
Lagarde, Marcela. Claves Feministas Para la Negociación en el Amor;
Gosto do jeito dela Da naturalidade de me contar os sentimentos mais intensos de uma maneira simples, Da abertura espiritual e da paz interna que transmite aos seres esteriores. Suas fragilidades não são mascaradas e isso é prova de uma força inigualável, Postura rara, admirável. Calma e sensível, Espinha ereta e corpo longícuo: É um conjunto de elementos que demonstram sua força, mas ela não faz força pra isso ~simplesmente é~
Keroll (18/08/15).
Maria, hoje foi mais um daqueles dias, que a gente tá com a cabeça no futuro e acaba esquecendo nosso presente duro. Sabe esses dias em que a gente foca na vida que devia ser e esquecemos da vida que temos? Para mim todo dia tem sido assim! Me disseram que nossos pensamentos criam nossa realidade. Eu juro que essa não é a realidade que pensei para mim há cinco anos atrás! Fui otimista, fiz tudo conforme manda o protocolo. Estudei as possibilidades, fiz um cronograma, coloquei no papel as metas, agi para alcançar os objetivos e morri na praia. Sem dinheiro e sem amor. Mas Maria, eu acreditei na ilusão de que estava no controle. Mas se somos responsáveis por tudo que acontece conosco. Como criei essa realidade? E agora, nesse exato momento, como estou criando o meu futuro? Eu não faço ideia. Não sei mais no que acreditar. Estamos no controle ou não estamos? Só sei que essas experiências me fazem pensar que não. Não estamos no controle, não da forma que gostaríamos de estar. Estamos num caminho, seguindo uma direção, uma estrada que converge para Luz. Estamos aprendendo a ser melhores. Não vivemos o que queremos, mas o que precisamos e merecemos. A ideia é aprender o amor. Estamos todos aprendendo a amar incondicionalmente. Mas olha a loucura que o mundo se encontra! Manter a sanidade é um luxo, não enlouquecer é um privilégio, seguir até o final, suportando todos os pesos, medos, decepções é só para os fortes. De vez em quando eu duvido da minha fortaleza, e juro que suplico por moleza. Mas a vida não é oba oba. A vida não é uma série de televisão. Não é diversão. Não é o que a gente vê no GNT ou OFF. A vida de quem é perfeita como na televisão? Quem come aquelas comidas e viaja para lugares incríveis que a gente nem nunca ouviu falar? Meu Deus quanta loucura! O que vejo na real é tanta miséria, gente sem dinheiro para o pão. Crianças com fome de sobremesa, olhos grandes olhando para o cornetto da jovem que passa do lado de lá do ponto. A mãe tentando distrair e a criança arrisca a pedir. A mãe lamenta, dinheiro contado, e lá se vai mais um desejo simples não realizado.
Maria, a vida aqui me aterroriza, estou desconectada com a minha alma, vim para uma missão nobre, todos nós viemos, mas estou distraída demais tentando ter sucesso, tentando não ficar para atrás. Tentando alcançar meus colegas doutores. Não tenho coragem de voltar para mim e aceitar a minha simplicidade. Fiz esse tal de Instagram e parece que todo mundo está fazendo algo importante. Minha vida simples parece tão desinteressante. Estou vivendo como uma morta-viva. Meu coração está um gelo, e nem é o frio do inverno que deixa meu peito gelado. É falta de abraço. Falta de acalanto, de olhar nos olhos, de fazer cafuné e deitar no colo. Tudo que eu sempre quis foi poder pagar meu próprio aluguel, criar gatos, pintar quadros, cantarolar manhãs, fazer biscoitos, bolos, fumar um cigarro e conversar com quem faz questão. Olha para mim agora Maria! Não sei quem sou, estou competindo com quem? Estou tentando ser sucesso para quem? Por que ando partida? Olhar que não seduz, corpo que se arrasta, medo que paralisa, sorriso que disfarça dor. Para quem são os livros que leio? Qual foi a última vez que habitei a mim? Quando deixei de ser eu? Quando ergui uma barreira entre mim os braços calorosos dos meus progenitores? Quem são as pessoas a minha volta? Quantas delas já não estão como eu? Mortas! O que fazer para acender a chama? Correr o perigo natural de quem se permite viver? Como devo proceder, o que devo abandonar?
Maria, hoje foi mais um desses dias de coração frio, mente apavorada, olhos buscando cor, peito pedindo calor.
Mas Maria, passei na Igreja e acendi uma vela, fiz uma prece e estou esperando o milagre. O que me deixa de pé, é que eu ainda acredito em milagres.
Aline Rafaela Lelis
Nota de Celular- escrito em 25 de julho de 2019
Desconforto pavoroso de coisas que não me cabem
Absorto, indecoroso em novas possibilidades
Tantas formas de me esconder em quem não sou
Não sei me rendo ou me esquivo do amor
Aline Rafaela Lelis
Se hoje navego por águas tranquilas, é porque eu acreditei na promessa de calmaria após a tempestade. Eu passei um tempo doente, e minha doença atingia meu espírito. Eu fiquei fraca, tão fraca... que já não era capaz de reagir a nada. Meus olhos amarelados e sem vida gritavam por socorro, e a fraqueza do espírito me levou a fraqueza da carne. Eu dormia dezesseis horas por dia e estava sempre fatigada. Quando estamos assim, muitas pessoas aproveitam da nossa incapacidade de auto-defesa. Nessa época fui humilhada por muita gente mesquinha. Mas eu não desisti da minha cura. Hoje, quando vejo a minha disposição e energia, fico imensamente grata à Deus por me sentir viva e cheia de energia para continuar lutando. E nesse processo, reciclei a alma e o corpo. Me sinto tão leve, amada e sagrada.
Hoje sei que milagres acontecem todos os dias!
Aline Rafaela
Notas de Celular (Começo de 2018)
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