Fazia tanto tempo que eu não sentia nos olhos de um homem um olhar de interesse para dentro, para a alma. Estava tão acostumada com o desejo lascivo, a libido espontânea, o gozar de alívio, sem intenção de afeto; que quando vi nos olhos daquele homem tamanha afinidade e empatia eu não soube o que fazer, muito menos o que pensar. Eu passei do ponto em que a compreensão da afetividade obedece a uma regra social, institucional e ideológica. Não, não tenho tempo de fantasiar historinhas românticas. Definitivamente não há nada a fazer a respeito daquele olhar. A não ser esperar e ver o que o Universo preparou desse encontro. Seja lá o que o destino reservou, é sempre bom lembrar que todas as coisas tem seu próprio tempo.
Aline Rafaela
(Primeiro texto pensando nele)
Setembro
O tempo muda
muda a estação
A vida nos empurra para a transição
Da inércia do inverno
Para o calor do verão
Que nos coloca em movimento
E o verbo desabrocha
Ensina-nos a ser mais como rosas
Lançamos luz no passado frio
E escolhemos florir na coragem
Na passagem
De um tempo cinza para outro
Aceitamos o novo
Aprofundamos a visão
Mergulhamos no mar imenso
Da nossa própria solidão
E nos sentimos fortes inteiras,
À nossa maneira
Sorrimos à toa,
Debochamos do que passou
Nos reconhecemos transitórias
Nos descobrimos notórias
Em cada verso, cada pensamento, cada momento
Setembro tem disso
É ritualístico, tem cor amarela
Recebe a primavera
Faz florir onde antes não havia possibilidade
Setembro tem essa personalidade
Por trazer a primavera traz a esperança
Por ser esperança nos embala na dança
Nos prepara para o renascimento
Tempo de fins e recomeços
Novos começos de luz e amor
Onde fatalmente buscamos ser mais
Como flor.
Aline Rafaela Lelis
Quando passa a tempestade e colocamos na balança a nossa vida afetiva, nos damos conta que criamos muita expectativa por pessoas que são mental e espiritualmente contrárias a nós, fazendo com que dispensemos uma energia enorme com quem não vale a pena.
Depois que nos sentimos amadas, esperamos ansiosamente ser amadas novamente. Pois sentir-se amada enche nossa alma de luz. Sentir que a pessoa em cima de nós quer nos dar prazer, quer nos proteger, quer passar horas conversando porque gostam da nossa companhia, é sinal que estamos sendo respeitadas pelo o que somos por dentro.
Isso é muito diferente de estar com homens que nos enxergam apenas como um corpo bonito e palpável e pensam em nós apenas como prazer efêmero para descarregar o peso de todas as suas frustrações. Muitas de nós temos sido um foco de descarga de homens involuídos. Que nos vêem apenas como seres descartáveis.
Depois de descobrir que o meu corpo é Sagrado, nunca mais me contentei com pouco. Eu afirmo todos os dias que a minha vida é abundante, especialmente no amor. E, assim eu vou nutrindo o meu amor interior e descobrindo um mundo incrivelmente infinito de possibilidades de crescimento.
Hoje o que me penetra é só LUZ e AMOR. O que vale à pena é a entrega de ambos a algo muito sublime e Superior. Se não for assim, não desperdice a sua energia com falsos elogios e falsas trocas de olhares, que tem como finalidade única usar você, e assim compartilhar apenas inquietação, medos, frustrações e prazer fugaz. Aquieta-te o coração e foque em você mesma, na sua feminilidade e nos poderes que só a força feminina é capaz de engendrar.
Mulher, seja a luz que você está destinada a ser no mundo!
Aline Rafaela
Na primeira doação perdi o chão. Na segunda o coração. Na terceira perdi a cabeça. E depois de perder tudo, aprendi que era preciso eu fazer mais por mim, muito mais... Então mudei o padrão. A minha atenção é para mim, o meu amor sou eu e o meu amigo é Deus. Com essa atitude, voltei a ter chão para pisar, recuperei o coração e a cabeça estraçalhados. Hoje, só tenho uma certeza: morro de amores por mim. Amo-me incondicionalmente. Aceito-me, incentivo-me. Cuido do meu corpo e do meu espírito. Aprendi a integridade, o amor de verdade e o valor de dedicar-me a mim mesma. Com isso, um novo horizonte se abriu à minha frente. Hoje não espero nada de ninguém. Amor é para quem tem. Curto estar sozinha, na minha companhia. Respiro fundo e em paz na minha presença. Nunca mais serei ausente de mim, não importa às circunstâncias. Fidelidade à alma é o segredo.
Aline Rafaela
Meus sonhos não cabem no coração!
Meus sonhos nunca ficam guardados
Eles têm asas próprias
Voam por aí buscando pouso
Não param nunca.
E eu?
Eu só acompanho o voo deles.
No fundo sei que tudo vale e não vale ao mesmo tempo
Então é preciso ter a destreza de não levar a vida tão a sério
O sonho está lá
A brilhar nos céus
Ele é que observa a gente lá do alto
Se ele vai pousar ou não
Se ele vai encontrar expressão,
Se vai tomar forma,
Não muda a nossa realidade mais intrínseca
De um dia nunca mais abrir os olhos e a boca
A gente perece
Mas o sonho não
"Sonhos não envelhecem".
Ficam soltos no ar
Eles nem são nossos
Os sonhos pertencem
A humanidade cósmica.
Aline Rafaela Lelis
“A vida à qual Jesus nos chama é completa loucura aos olhos do mundo.”
— Louco amor, Francis Chan.
Oração
Enquanto aguardava o ônibus na guarita, percebi que estava no meio de uma estrada e que dois homens me observavam invasivos e sedentos. Talvez esperando qualquer “sinal” meu que eles pudessem interpretar “essa aí tá pedindo”. Eu comecei a ficar nervosa e angustiada. Os dois me olhavam e conversavam entre si. Enquanto isso, os motoristas que passavam em suas carretas gritavam qualquer coisa, “cantada?”. Foi então que comecei a pensar em todas as mulheres que talvez, naquele momento, estivessem passando pela mesma situação, com medo, sentido-me culpada antecipadamente por um crime que sequer havia ocorrido. Eu pensava: “Se aqueles homens que me observam há um metro de distância ou qualquer homem que parasse seu automóvel agora me violentasse, eu seria a culpada, afinal, por que não escolhi outro lugar para pegar o ônibus? Ou por que não resolvi meu problema antes, para não precisar estar aqui sozinha? Ou ainda, por que estou de cropped na beira do asfalto?” Fiquei com vontade de chorar. Coração apertado. Daí comecei a pedir ajuda das deusas, fui evocando mulheres que admirava, pensando nas minhas ancestrais, e uma canção foi entoada. Senti meu corpo arrepiar e a presença de uma forte energia que acalentava meu desespero. De repente me senti forte. Me senti uma guerreira e juro que seria capaz de destruir qualquer homem que atentasse contra meu corpo. A canção entoada foi assim:
“Iansã me proteja de todo mal de todo homem.
Iansã me proteja de todo mal de todo homem”.
Entoei essa canção e marquei o ritmo com palmas. Senti no coração a força de uma legião de mulheres guerreiras. Não parei de cantar um segundo. Até que os dois homens que me observavam foram se distanciando, e em pouco tempo um homem uniformizado se aproximou. Ele era funcionário da empresa de transporte que eu aguardava, esperava o mesmo ônibus, chegou com serenidade nos olhos, não o vi como ameaça. Diminuí meu canto e passei a repeti-lo mentalmente. Meu ônibus chegou. Mandei uma mensagem para uma amiga sobre como estava me sentido. Ela respondeu: “Sinto muito que esteja se sentindo assim. Sinta-se abraçada. Você não está só!”
Aline Rafaela
Buscando forças das entranhas
Sigo dando o melhor de mim
Tem dias que sou aconchego
Calmaria
Chá de alecrim
Noutros dias
Bate tristeza
Sufoca as dúvidas
Tenho pena de mim
Porém não esqueço
Das palavras de um
Sábio aprendiz
Dizendo-me com seus olhos verdes
Arregalados
Para eu não desistir
A estrada é estreita
O caminhar é árduo
Mas lembra-te menina
Que você é trampolim
Pense nas meninas
E nos meninos
Que virão depois de ti
Eles saberão
A partir do seu legado
De tudo que é possível
Construir
Aline Rafaela Lelis