Antes Mesmo Que Os Primeiros Raios Solares Rasgassem O Véu Da Madrugada , Neslihan Já Percorria O Caminho

antes mesmo que os primeiros raios solares rasgassem o véu da madrugada , neslihan já percorria o caminho até o pequeno complexo esportivo , a raquete equilibrada entre os dedos . o aroma fresco da grama recém aparada , meticulosamente ajustada aos padrões internacionais , impregnava seus sentidos , oferecendo um instante fugaz de alívio . mas nem mesmo aquele perfume familiar conseguia dissipar por completo a sensação de exaustão latente , o peso dos dias recentes transformando-a em um animal ferido , perdido na escuridão de uma floresta desconhecida . retirou o cardigã , sentindo o arrepio escalar-lhe os braços sob a brisa cortante da alvorada , após depositar a bolsa junto à rede — um ritual já automático — , com as raquetes extras . por vezes , dependendo do humor , estourava as cordas de poliamida com a força desmedida de seus golpes , como se o próprio equipamento carregasse consigo a frustração acumulada , então sempre trazia as excedentes . com os cabelos firmemente presos no alto da cabeça e os nervos tensionados , não desperdiçou tempo com aquecimentos triviais . a corrida ao redor da villa , antes de ceder à tentação de pegar o carro e dirigir até ali , fora mais do que suficiente para preparar os músculos . seu único objetivo era derrotar a máquina lançadora — um adversário silencioso , preciso e incansável . e assim , a mulher se perdia nos movimentos meticulosamente calculados , os golpes ressoando contra as cordas tensionadas da raquete , canalizando a exasperação que lhe queimava por dentro . o tempo se tornava irrelevante , a única certeza era o alívio sutil que se insinuava em seus ombros , a rigidez gradualmente cedendo enquanto sua mente se libertava das inquietações que , dia após dia , pareciam se entranhar mais fundo em seu consciente .

um sorriso despontou quando sua memória a transportou para o instante em que segurou uma raquete pela primeira vez — uma das muitas exigências paternas . dentre todas , talvez aquela fosse uma das poucas que ainda preservava com apreço , mesmo que , na época , as cordas fossem de tripa natural , um material que agora se recusava a sequer ponderar . o cenho se franziu ao recordar os treinos extenuantes , excessivos para uma criança sem qualquer ambição profissional no esporte , mas menos que a perfeição jamais fora aceito sob o teto dos şahverdi , então se tornou a norma . a respiração adquiriu uma cadência melancólica ao lembrar dos dias em que tinha companhia – uma companhia que ia além da miríade de treinadores cuja simples presença a fazia desejar nunca mais encará-los . matteo surgiu em sua mente como um relâmpago — um vestígio confuso em sua mente com a forma como tudo havia se desfeito , em meio ao caos infernal no qual ela era a personagem principal .

com o suor escorrendo por cada poro de sua pele , sacudiu as memórias com um último golpe certeiro na bola final lançada pela máquina . levando as mãos à cintura , puxou o ar límpido da manhã para dentro dos pulmões exaustos , contando mentalmente até dez . na última expiração , foi arrancada de seu momento de trégua por uma voz masculina . por um breve instante , sentiu a alma sair do corpo , como se sua própria lembrança tivesse evocado matteo em carne e osso à sua frente . com a destra pousada sobre o coração acelerado , inclinou levemente o quadril e esboçou um sorriso contido — um reflexo de algo reprimido há muito tempo , ou talvez apenas até o momento em que todos foram tragados pelo mistério que pairava sobre khadel como um véu espectral . quando sua rotina meticulosamente planejada começou a ruir . ❝ ei , teo . ❞ o apelido escapava com naturalidade , como se treze anos não tivessem se esgueirado entre eles sem quase nenhuma palavra trocada . enquanto caminhava até a bolsa descartada , procurando pela garrafa , seus olhos captaram um detalhe que fez o pequeno sorriso persistir , a raquete que pendia das mãos dele , os adesivos no cabo denunciando sua familiaridade . ❝ nunca te vi por aqui antes… mas suponho que nossos horários se diferem na maior parte dos dias . ❞ ergueu uma sobrancelha , indicando com o olhar o objeto desgastado entre os dedos masculinos . ❝ veio jogar sozinho ou aceita companhia ? ❞ a pergunta carregava o mesmo tom melancólico das lembranças que há pouco enevoaram seus pensamentos . ❝ eu poderia usar um adversário mais desafiador . ❞

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Quadra de tênis

Sua rotina de exercícios focava em musculação e atividades que ainda poderiam ser feitas na Casa Comune, como kickboxing, Muay Thai ou boxe. Porém, vez ou outra, Matteo gostava de se aventurar em outros esportes. Fosse para causar um pequeno desconforto no seu corpo ao experimentar algo novo, fosse para quebrar um pouco a monotonia do conhecido, ele achava que colocar coisas diferentes na sua rotina lhe traria algum benefício. Era por isso que, naquela manhã, ele optou pelo tênis. Pegou uma raquete esquecida dentro da garagem abarrotada de quinquilharias e logo a onda de memórias associadas ao objeto veio em sua mente.

Ele tinha treze anos e pegou uma raquete no quarto de Neslihan. Ela estava tentando ensiná-lo algo de matemática, mas a mente inquieta de Matteo não conseguia focar nas equações. Ele não entendia porque as coisas lhe eram tão mais difíceis quanto para os seus colegas, mas os números, letras e formas pareciam dançar na folha, causando sua própria inquietação. Ele perguntou para ela o que era aquilo e, mesmo entre um olhar autoritário que dizia que ele devia estar prestando atenção em outra coisa, ela explicou para ele o jogo.

Aos dezesseis anos foi provavelmente quando jogaram o último jogo juntos. Cada dia mais suas lições ficavam espaçadas. Algumas vezes interrompidas por causa da nova rotina física de Matteo, outros dias por algum compromisso que Neslihan possuia. Parecia que suas agendas nunca alinhavam, tão raro quanto um completo alinhamento planetário e Matteo só sabia responder com a única expressão externa que conseguia oferecer aos outros: indiferença. Não podia ir atrás dela. Ele nem sabia o que havia acontecido para o afastamento. Depois daquele dia nunca mais se encontraram intencionalmente dentro ou fora da quadra.

Tinha vinte anos e havia jogado algumas vezes aleatórias, ainda com a raquete emprestada que nunca devolveu. Algumas objetos ficavam perdidos pelo contato entre aqueles que os manipulavam e esse era um dos casos. Talvez nunca voltaria ao verdadeiro dono. Parou de jogar por muito tempo.

Agora, segurando a raquete, ele percebia o quanto ela parecia pequena na sua mão e muito mais velha que lembrava. Talvez fosse a camada de poeira que lhe cobria, depois de longos anos em desuso. Ele girou na mão e decidiu levá-la, mais pelo valor sentimental do que pela praticidade. Provavelmente teria que alugar uma nova para poder jogar. Mas algo de tudo que estava acontecendo, a ligação do grupo mais improvável que poderia ser colocado junto em Khadel, fazia com que ele pensasse mais sobre as suas conexões, ou a falta delas. No fundo Matteo sabia que a indiferença com que levava a vida seria sua ruína. Sozinho, desconfiado e provavelmente rabugento. Era assim que terminaria. Não poderia culpar nenhuma maldição pelo desamor, ele mesmo afastava qualquer um que se atrevesse a tentar estar na sua vida.

Como se evocasse o fantasma de Neslihan com aquela raquete, ele avistou a mulher numa das quadras assim que chegou no lugar. Era cedo, talvez cedo demais, para agir indiferente e fingir que não havia lhe visto. Eram as únicas almas ali naquele horário, tirando o jovem na entrada que havia o recebido. Matteo respirou fundo e foi em direção à mulher, tentando pensar em algo para dizer, mas tudo parecia ficar àquem do desejável. "Ei," cumprimentou, soando patético na sua cabeça, mesmo que nada realmente escorrece ao exterior.

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( @khdpontos )

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5 months ago
O  prefeito  de  khadel  se  sente  honrado  em  ter  NESLIHAN ŞAHVERDI GÖKÇE  como  moradora
O  prefeito  de  khadel  se  sente  honrado  em  ter  NESLIHAN ŞAHVERDI GÖKÇE  como  moradora

o  prefeito  de  khadel  se  sente  honrado  em  ter  NESLIHAN ŞAHVERDI GÖKÇE  como  moradora  de  sua  excêntrica  cidadezinha. aos  seus  VINTE  E  NOVE anos  ,  ela  é  bastante  conhecida  pelos  vizinhos  como  A  MILITANTE . dizem  que  ela  se  parece  com  HANDE  ERÇEL  ,  mas  é  apenas  uma  ADVOGADA  DE  DIREITOS  HUMANOS  &  CONSULTORA  DE  COMPLIANCE  .  a  ausência  do  amor  em  sua  vida  ,  deixou  NES um  pouco  AUTODESTRUTIVA  e  CONDESCENDENTE  ,  mas  não  lhe  atormentou  o  suficiente  para  deixar  de  ser  AUDACIOSA  e  EMPÁTICA  .  esperamos  que  ela  encontre  a  sua  alma  gêmea,  quebre  a  maldição  da  cidade  e  consiga  ser  feliz  !

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𝐂𝐇𝐀𝐑𝐀𝐂𝐓𝐄𝐑 𝐏𝐀𝐑𝐀𝐋𝐄𝐋𝐒 : vivian lau & dante russo ( king of wrath ) , monica geller ( friends ) , francesca rossi ( the kiss thief ) , lidia pöet ( la legge di lidia poët ) , ceylin erguvan & ilgaz kaya ( yargi ) , marissa cooper ( the o.c ) & amal alamuddin clooney !

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𝐎𝐕𝐄𝐑𝐕𝐈𝐄𝐖 :

apelidos : nesi , nes , hani ( para pouquíssimos muito próximos , ou que querem irritá-la , a sonoridade é bastante similar à de honey )

data de nascimento: 20 de novembro , 1995 !

orientação sexual : bisexual !

filiação : münevven şahverdi & kadir şahverdi !

altura : 1,75 cm !

cabelos : longos fios acastanhados que pendem em ondas naturais !

olhos : castanhos levemente avermelhados !

tatuagens : uma libélula logo abaixo da nuca , realizada em homenagem à münevven !

piercings : cinco perfurações adornam cada um dos lóbulos , sempre carregando delicadas joias prateadas !

animais de estimação: mark ruffalo ( cane corso resgatado de maus tratos ) , chaz bono & virginia woolf ( greyhounds resgatados de corridas ilegais ) , francis minor , henry blackwell & angela davis ( gatos srd resgatados de maus tratos ) , carmine , kırmızı & vermillion ( puros-sangues ingleses resgatados de corridas ) & gül ( um hanoveriano com o qual competia desde os quatorze anos ) !

educação: bacharelado em direito ( università degli studi di siena ) , mestrado em direitos humanos e direito internacional público ( oxford university ) & doutorado em ética e estudos legais ( wharton - distance learning , em andamento ) !

idiomas: italiano , inglês , turco , português , espanhol & francês !

O  prefeito  de  khadel  se  sente  honrado  em  ter  NESLIHAN ŞAHVERDI GÖKÇE  como  moradora

𝐒𝐊𝐄𝐋𝐄𝐓𝐎𝐍 :

❝  ela  é  uma  tempestade  em  meio  à  calmaria  da  tradicional  família  rica  em  que  cresceu. com  uma  postura  firme  e  uma  voz  poderosa  ,  ela  defende  suas  crenças  em  um  mundo  que  parece  ignorá-las. vegetariana  e  feminista  ,  não  hesita  em  expor  sua  indignação  contra  o  machismo  e  o  preconceito  que  a  cercam. sua  coragem  e  determinação  a  tornam  uma  líder  nata  ,  embora  isso  a  distancie  dos  familiares  egoístas  que  só  se  importam  com  o  dinheiro. com  um  coração  generoso  e  uma  mente  crítica  ,  ela  é  uma  força  da  natureza  ,  pronta  para  lutar  por  um  mundo  melhor  ,  mesmo  que  isso  signifique  arrumar  umas  brigas  por  aí  ! ❞

O  prefeito  de  khadel  se  sente  honrado  em  ter  NESLIHAN ŞAHVERDI GÖKÇE  como  moradora

𝐁𝐈𝐎𝐆𝐑𝐀𝐅𝐈𝐀 :

𝐓𝐖 - menção de distúrbios psicológicos e transtornos alimentares, menção de abuso e manipulação mental e emocional & negligência parental !

a poderosa família turca , uma fortuna proveniente da indústria têxtil de luxo datada de séculos e com fortes conexões italianas , um império de exportação de tecidos finos para finalidades da alta costura no mercado internacional . com alcance global às custas de práticas de exploração , evasão de impostos , corrupção , manipulação e crime organizado , há gerações os şahverdi utilizam khadel como esconderijo idílico . pilares da alta sociedade atemporal que apenas o dinheiro secular , e casamentos arranjados , são capazes de prover .

a par dos bastidores sórdidos do legado familiar , ainda na jovem infância foi despertado um senso de indignação , que só cresceria com o tempo . destacando-se pela inteligência brilhante , chegando a ser considerada um prodígio , o intelecto era visto como uma ameaça ao ideal da dama perfeita , constantemente pressionada a se moldar às expectativas centenárias de recatamento , etiqueta, submissão e requinte . a futura , e impecável , esposa quintessencial de algum herdeiro de família  influente .

a pressão constante , aliada às manipulações e abusos mentais , não poderia deixar de gerar um profundo sentimento de inadequação. o desejo de ser a própria pessoa , conflitando com o peso das tradições , logo culminou em episódios severos de ansiedade e auto destruição , seguidos na adolescência por um diagnóstico preocupante de bulimia , e o que mais tarde , já quase em fase adulta , seria identificado como transtorno de personalidade limítrofe . tentativas falhas de retomar o controle de uma vida que a si nunca pertenceu .

a ruptura deu-se no ápice de insubordinação , quando — apresentada a um destino de perpetuação do vicioso ciclo de subserviência e menosprezo , sua mão prometida ao maior lance — ousou indagar sobre questões éticas ligadas aos negócios da família e recusar um destino de docilidade corrompida . a vergonha pública tamanha se tornou imperdoável , e as ruas de khadel foram apresentadas como única solução ao seu deserdamento . a figura materna , devastada, nada decisiva nas tentativas de reverter a situação .

a distância da presença vil e esmagadora provocou dependência de antigos laços de amizade, que se provaram verdadeiros . a ânsia por ser o que sempre sonhou maior do que a própria capacidade de lidar com as consequências . um intenso resvalo com a própria morte e a quase fatalidade de outrem em suas palmas , borderline como combustível e força motriz , levaram-na a um caminho , antes , completamente utópico . khadel já não era mais um refúgio , e no semblante afável e acolhedor de uma assistente social , encontrou passagem para um eu do futuro .

a mudança para siena não veio sem reveses , o sentimento de perseguição , e profunda angústia quase retomando os hábitos nocivos e a retornando aos braços de khadel . a familiaridade , ainda que tóxica , parecia reconfortante . lidia poët , no entanto não permitiria . a conexão com a figura histórica , fez do investimento de habilidades , valores e senso crítico , uma carreira estelar no direito , a ênfase em direitos humanos um complemento óbvio, e essencial .

a cidade natal não foi uma escolha imensamente desejada , ainda que o magnetismo fosse quase sufocante , mas  necessária com a partida de münevven şahverdi . o legado materno maculado pelo segundo casamento paterno meros meses após as rosas serem dispostas sob o mogno selando o rosto , ainda jovem , marcado pela tortura psicológica decenal . o que restou de münevven — além de memórias oscilando entre afeto e mágoa — , uma herança exorbitante , os gökçe tão afluentes quanto os şahverdi , então repassada à herdeira de ambos . a fúria patriarcal era esperada , o senso de traição latente em uma face desalmada e cruel que teria reivindicado os últimos resquícios da falecida esposa , não fosse pelo retratado testamento .

a certeza de que vínculo romântico algum justificaria fim desonroso como o de münevven , antiga no consciente , se intensificou , enrijecendo ideias que se tornavam então um credo . reinvenção como chave , o sobrenome patriarcal já não era um que se identificava , adotou o gökçe materno como parte da sua nova identidade , e na posse de uma fortuna livre de amarras , o uso fez-se na construção do legado , e mudança , que gostaria de ver no mundo . ou ao menos em seu mundo . 

a advocacia caiu como uma luva , encabeçando novas pesquisas e políticas , os dígitos imersos no pulso da transformação , tornando o epíteto “a militante” , para alguns derrogatório e para outros admirável , uma conotação pessoal para além da denotação . sinônimo de coragem , altruísmo e justiça , não apaga as cicatrizes , e sequelas , de um passado ainda presente . inflexível , reativa e condescendente , o exterior forte ainda apresenta fissuras sob o peso de tudo que perdeu , ou melhor , nunca teve . o pânico e impulsividade são batalhas diárias , exaustivas , incapazes de desfazer as amarras em uma psique incrivelmente vulnerável à rejeição , suscetível a dolorosa instabilidade , que luta por um mundo mais justo com o mesmo fervor que se destrói .

@khdpontos


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4 months ago
Missing Object : O Broche De Kimberly By : @aaronblackwell & @neslihvns 📍 Monte Cielo - Polizzi Generosa
Missing Object : O Broche De Kimberly By : @aaronblackwell & @neslihvns 📍 Monte Cielo - Polizzi Generosa

missing object : o broche de kimberly by : @aaronblackwell & @neslihvns 📍 monte cielo - polizzi generosa , região metropolitana de palermo . sicília !

Aaron estava sentado diante do laptop, a tela iluminando seu rosto cansado. O Monte Cielo era um desafio real, muito além de uma simples escalada. Ele analisava mapas topográficos, cruzava informações meteorológicas e lia relatórios de expedições anteriores – as poucas que tinham voltado para contar a história. O tempo ali era instável, as tempestades podiam se formar em questão de horas, e o gelo acumulado tornava tudo mais traiçoeiro. O que mais chamava sua atenção, no entanto, era a falta de registros sobre o Vale dos Desaparecidos. Nenhuma informação concreta, nenhuma explicação plausível. Apenas teorias e lendas.

Ele já teria descartado isso antes. Mas agora? Agora ele estava aceitando que talvez existisse algo além do que a lógica poderia explicar. Não era só o mistério do monte, ou o fato de todos que tentaram voltar de lá saírem confusos, era tudo que estava acontecendo com eles. A maldição, as coincidências que não pareciam coincidências, e principalmente... Nes. A presença constante dela em sua vida, a parceria entre eles, a sintonia e as similaridades. Blackwell passou muito tempo pensando na história das almas gêmeas e em como talvez Nes ocupasse um lugar outro, ainda mais especial para ele, de irmã, de quem ele podia contar. 

Por mais que Neslihan ainda nutrisse profunda resistência em aceitar que aquilo tudo poderia envolvê-la de qualquer forma que fosse, Aaron parecia querer desvendar e ponderar sobre o mistério, Olivia parecia querer encontrar verdadeiro amor em sua vida — e desconfiava dos motivos para tal —, e não havia medo de condenar alguém a passar o resto da vida consigo no mundo que a faria rejeitar duas das mais importantes presenças em sua vida. Obra do acaso, ou não, porque ela tinha um quê de dúvida acerca da imparcialidade de Aaron com aquela divisão, a Gökçe o tinha ao seu lado, e fora o único motivo por ceder mais facilmente às demandas de Zafira. As passagens, reservas e credenciais eram todas adquiridas com relutância, bem como o guia, que, por segurança ante as informações que recebera de Ace, vira-se obrigada a contratar.

Palermo. A cidade conversava com Neslihan pela confluência de culturas que a compunha, assim como fazia com a mulher, pela arte e pela gastronomia. O azul do Tirreno a acalmava, talvez pela possibilidade de perder-se na imensidão que comportava. A Sicília como o afago de uma avó, que ela nunca conhecera, mas na ilha sentia o calor do afeto. Chegar até o local era relativamente fácil, a viagem de carro até Florença era carregada de uma tensão sutil, embora as palavras entre eles fluíssem com a familiaridade de mais de duas décadas. Já o voo de pouco mais de uma hora era passado em completo silêncio, os pensamentos perambulando de um canto a outro do mundo ante as possibilidades e a monumentalidade do que o futuro reservava. Com o desembarque, outro carro elétrico os esperava, e a distância entre o aeroporto e o Grand Hotel et des Palmes era percorrida em um piscar de olhos ressecados e pálpebras em espasmo, inquietação e apreensão consumindo cada terminação nervosa do próprio corpo. Com os nomes deles dados na recepção, era como um anúncio apocalíptico do que os esperava. A noite que deveria ser um interlúdio de descanso, logo tornou-se um turbilhão de inquietude, e a mulher viu-se tentada a procurar alento no imprevisível, somente a noção de que Aaron estava a alguns metros longe de si, fez com que se contentasse com inúmeras voltas na piscina, o gélido da água cortando a apreensão que se alastrava por seus membros.

As mochilas abastecidas de provisões os esperavam na manhã seguinte, ambas fixas ao aperto de Alessandro, quem os orientaria e guiaria o caminho pelo Monte e Vale. A expressão adornando o rosto alheio só poderia ser descrita como contrária e reticente, e um toque apreensivo se esgueirou pela consciência de Neslihan, mas a urgência em suas veias logo fez com que o raciocínio se dissipasse. O navegador dava as direções enquanto tensão pesava nos ombros femininos, o volante agindo como amortecedor para o aperto de suas palmas, Aaron ao seu lado, tão taciturno quanto a introspecção que ela adotava. Sandro parecia inquieto, os olhos perambulando pelo interior do carro, pela vista panorâmica da ilha, encarando as próprias mãos e com respostas de apenas uma palavra por todo o trajeto de quase duas horas até o Monte Cielo.

O pico glacial reluzia sob o céu límpido, o gelo refletindo como um diamante. Mesmo ao pé da cordilheira o ar já era lancinante, fisgando os pulmões e cortando as bochechas. Com um longo olhar trocado entre eles, ergueram a bolsa contendo os equipamentos que ele havia alugado, retirando as roupas apropriadas e as vestindo por cima das camadas térmicas que Alessandro havia os instruído a portar. A previsão era inconstante, como parecia ser a norma nos arredores da cadeia de montanhas que tinha o Cielo como o maior pico, e não sabendo o que exatamente os esperaria, equipavam-se com piolets, arneses, celulares analógicos, crampons, GPSs com bússola, capacetes, luvas, bastões, cordas, botas e barracas térmicas. Garrafas com água e comidas eram mantidas separadas, em compartimentos impermeabilizados e próprios, de fácil acesso. Por sorte, ambos possuíam um bom condicionamento físico e apenas uma aclimatação de algumas horas, nas partes mais planas e baixas do Monte, fora necessária.

A centenas de metros do nível do Tirreno, Aaron e Neslihan então começavam a ascensão de milhares de metros até o topo, para então se aventurarem no desconhecido do Vale, onde o suposto avião havia desaparecido há quase um século. O terreno íngreme era a menor das preocupações, quando glaciares repletos de crevasses tornavam cada passo incerto. Nevascas os faziam se agarrar à encosta da montanha traiçoeira, por horas incapazes de sequer enxergarem um ao outro, apenas o instinto comunicando que não haviam perdido a conexão que os mantinha próximos. Em meio às tempestades, a neve parecia se intensificar a cada centímetro que se aproximavam do pico, a barraca se tornando inútil, impossível de ser utilizada com o entardecer. Com a junção de vento e rocha os punindo, conseguiam apenas aterem-se aos bastões cravados no aclive de gelo. Neslihan era incapaz de pensamentos além de súplicas ao universo, o coração apertando a cada movimento que os aproximava do desconhecido. Não era bem aquele tipo de adrenalina que ela gostava de se alimentar.

No caminho, o cansaço pesava. O frio, a altitude, o tempo. Cada passo parecia um esforço monumental, e o pior era saber que isso ainda não era nem metade da batalha. Ele segurava firme os equipamentos, tentava manter a clareza para que pudessem continuar. Mas ele estava esgotado. Mental e fisicamente.

Missing Object : O Broche De Kimberly By : @aaronblackwell & @neslihvns 📍 Monte Cielo - Polizzi Generosa

A subida, que deveria ter sido finalizada em um dia, já tomava quase dois, e cada segundo era um fôlego roubado de seu futuro. Um peso de centenas de anos parecia afixado ao seu peito, os braços tremulando e pernas cedendo ao terreno irregular e enganoso. A garganta se fechava e a respiração ofegante não era somente pelo esforço físico, mas por puro medo de perder Ace, de jamais chegarem ao outro lado quando tinham tomado para si aquela responsabilidade. O sentimento pujante tomava conta de cada terminação nervosa da Gökçe. Ao mesmo tempo em que perdia o equilíbrio em uma das passagens estreitas, somente o aperto de Aaron a mantendo como membro do reino dos vivos, praguejava Zafira, Khadel, Rose e quem quer que estivesse envolvido naquela sandice que a colocava à beira de um colapso.

À medida que as horas passavam na montanha carregada de neve e os perigos iam aumentando, Aaron se sentia quase sufocado pelo medo de algo acontecer com sua parceira, sua dupla, a pessoa que esteve ao seu lado nos melhores e nos piores momentos. Era um medo absurdo e irracional de perdê-la. Ele sempre cuidou dela, de um jeito ou de outro. Mas a viagem estava deixando tudo mais claro. O medo que sentiu ao vê-la quase perder o equilíbrio em uma das trilhas íngremes, a maneira como seu coração apertava toda vez que o tempo fechava de repente e ela desaparecia de vista por um segundo. Ele sempre viu Nes como sua melhor amiga, sua parceira de caos. Mas e se fosse mais do que isso? As coisas estavam confusas demais naquele momento e Aaron decidiu que talvez não fosse a hora de descartar hipóteses de maneira tão enfática.

Então, como o raiar de um novo dia, o topo estava diante deles. Deserto, desprovido de nuvens, a visão era vasta, e de onde estavam, o ar rarefeito e o cansaço físico faziam do pico uma miragem, um oásis de calmaria. Resfolegando, Neslihan, pela primeira vez desde que encontrara os olhos de Aaron na comuna de Polizzi Generosa, deixava que seu olhar se firmasse ao dele novamente. As íris se embaçavam com lágrimas, rapidamente contidas, mas permitia que as palmas enluvadas fizessem o caminho até as dele, sentindo a segurança que ele exalava, mesmo que exaurido, como ela. 

Deveriam ter esperado, passado a noite descansando os músculos esgotados e recuperando a sanidade, permitindo que as mentes se acalmassem, mas já haviam perdido tempo demais na subida, e tempo era a essência. O Vale os aguardava, clamando por eles, uma força maior que os puxava para o epicentro do desconhecido. O vão entre o Monte Cielo e o Monte Vespero era o lar do Valle degli Sconosciuti, completamente inexplorado e isolado. Quase mítico, nem a mais extensa das pesquisas tinha fornecido detalhes concretos a Neslihan e Aaron. Sabiam apenas que o gelo que cobria o local era quase impenetrável, soterrando qualquer vestígio da queda secular. Com apenas algumas horas ociosas, eles discutiam possibilidades e planos, enquanto Sandro permanecia alheio, e quando se levantaram, vestindo, calçando e prendendo os equipamentos, o motivo por tal logo se revelou.

Alessandro anunciou que os levaria apenas até aquele determinado ponto. E ele não parecia do tipo que recuava fácil. Aquilo acendeu um certo alerta de perigo na mente cautelosa de Aaron, a preocupação parecia aumentar cada vez mais e ele se perguntava se talvez não fosse melhor pegar na mão de Nes, dizer que tudo ia ficar bem e abortar a missão. Será que valia tanto a pena assim descobrir quem era sua alma gêmea? De que valeria saber de qualquer coisa se havia um grande risco de morrerem? ❛ Daqui em diante, vocês estão sozinhos ❜, foi o que disse, quase como um aviso. Aaron deveria ter escutado. Deveria ter reconsiderado. Mas Nes já tinha conseguido as autorizações, e não era como se ele fosse deixá-la seguir sozinha. E se havia uma coisa que sabia sobre a amiga, é que ela conseguia ser cabeça dura quando queria. Ainda mais do que ele.

Os olhos de Neslihan faiscavam em fúria, e não fosse pela necessidade do piolet para o retorno, teria arremessado o objeto pontiagudo na figura do homem de meia idade. Se ela pudesse, teria o enterrado no declive, para nunca mais ser encontrado. Fosse ela um pouco mais cuidadosa em seu raciocínio, anuviado pela impetuosidade dos sentimentos de indignação e raiva, um sinal teria ascendido aos pensamentos, um aviso de cautela em seu consciente. Com profanidades na ponta da língua, somente a urgência de seguir em frente e acabar com aquele mistério que parecia intrigar o Blackwell e algum dos outros, fez com que ela lançasse apenas o mais vil dos olhares a Alessandro, antes de seguir a passadas firmes as imediações do pico até o outro lado.

De acordo com o mapeamento feito por Aaron, deveriam permanecer na encosta no sentido Sul por alguns quilômetros e então Leste. A apenas alguns passos na direção necessária, uma cortina de neve parecia cair sobre eles, como se eles houvessem pisado em um sensor ativando o temporal gélido. Com a baixa visibilidade, e sem o auxílio do guia, eles não tinham opção alguma se não manterem-se presos um ao outro pela corda de poliamida. Algumas horas seguindo o que achavam ser a porção austral da descida, por sorte não eram surpreendidos por profundos crevasses, mas seracs pareciam se esgueirar pelas laterais, formando uma trilha quase transcendente. Quando se depararam com uma formação impossível de escalar, restou a eles a única opção de contorná-la, e com o primeiro movimento fora do esperado consultaram os GPSs. Para o completo desespero, a agulha que supostamente deveria estar magnetizada aos polos da Terra, se movia em todas as coordenadas possíveis, hora indicando um passo deles para o Norte, o seguinte para o Oeste, outro para o Sul, e cada um dado na mesma direção que o anterior.

Pressionando as palmas contra as pálpebras cerradas, Neslihan virou-se para Aaron, repousando a testa sobre o ombro masculino. Tomando profundas respirações, pânico parecia querer tomar conta de seus pulmões, apenas o peso da mão dele contra o próprio braço fazia com que parte do senso retornasse aos nervos. Lembrava-se então do telefone com sinal de satélite, e com esperança, retirava o aparelho do bolso, somente para perceber que ele também parecia estar com mal funcionamento. Eles estavam perdidos. Completamente perdidos. Recostando contra a formação de gelo, as têmporas latejavam. Eles tinham apenas uma garrafa de água entre eles e dois pacotes de frutas desidratadas até conseguirem a saída daquele inferno gélido.

Com o olhar voltado para o horizonte que parecia infinito, um cintilar fisgou a atenção das íris marejadas. Um brilho tão sútil em meio à tormenta alva da nevasca, que precisou de um tempo isolando as palavras de Aaron, para que o prateado fosco se registrasse na retina. Exclamando, desprendendo-se dele com a abertura do mosquetão, disparou em direção ao lampejo, sem dar-se conta do ranger do gelo que seguia em seu encalço. Sabia que o homem a acompanhava, ele iria até nos confins do Universo com ela, e faria o mesmo por ele. A corrida até o que parecia poucos metros de distância mais se aproximava de uma hora, os olhos castanhos fixos ao ponto enquanto batalhava com a fadiga na respiração, o peso da mochila, e o vento que machucava a ponta do nariz, bochechas e lábios descobertos. Aquela adrenalina de um risco dando resultado era a que a energizava.

Um último pulo sobre um crevasse pequeno os colocava de cara com o que somente poderia ser a fuselagem do avião perdido. Os joelhos se afundavam na vastidão branca ao mesmo tempo em que eles arrancavam o primeiro par de luvas, cavando nos arredores da protuberância metálica exposta. O segundo par de luvas logo se tornava encharcado e Neslihan então percebia o possível motivo pela visibilidade repentina do metal retorcido. Degelo. Um riso amargo escapava a garganta ressecada. Aquecimento global, justo o que tanto a preocupava e uma de suas maiores causas, naquele momento era o maior aliado que eles poderiam pedir. Compreendia então a razão por aquele acidente parecer tão quimérico, sem visuais, sem vestígios. Somente diante do aumento das temperaturas, o derretimento do gelo e neve que se formara ao longo de quase cem anos, era possível. Balançando a cabeça em incredulidade, permaneciam tateando toda a superfície esbranquiçada, encontrando ouro, prata, bronze, madeira, louças, cerâmicas. E então, como se um ímã os atraísse, alcançaram ao mesmo tempo uma caixa não muito maior que a palma feminina.

O porta joia parecia feito de genuíno casco de tartaruga, o material pulsando entre as mãos deles, que o seguravam firmemente, receosos de que fosse uma miragem delirante de ambos. Firmando a ponta de um dos dedos da luva entre os dentes, Neslihan puxou-a delicadamente, descobrindo os dígitos, que imediatamente protestaram a temperatura negativa. Tremulando, apalpou o calor que parecia emanar, até encontrar um pequeno botão, que fez a tampa se abrir lentamente, o mecanismo certamente enrijecido pelo tempo e frio. Aninhado no veludo tão escuro como a noite, o broche descansava. Assim que tocaram o marfim que formava a delicada rosa, o mundo cessava. Os flocos de neve suspensos por meros segundos, as orbes deles presas umas às outras, castanhas às azuis. Um peso antigo que a eles não pertencia se espalhava pelo corpo de cada um, os paralisando por milésimos, antes de todas as sensações retornarem em um ímpeto, os sufocando momentaneamente. Haviam encontrado a relíquia. Imediatamente a mulher dispensava a experiência que beirava o sobrenatural como puro alívio percorrendo o sangue.

O que poderia ser descrito como euforia tomava as reações de Neslihan, que se atirava ao abraço de Aaron no mesmo instante. O sorriso era contagiante, e eles comemoravam, não importava que logo precisariam enfrentar o processo todo novamente, agora com a adição dos compassos digitais e telefones defeituosos. Os lábios entreabriam para comemorar, quando tudo ruiu. 

O estalo foi a única coisa que deu tempo de ouvir antes de tudo se partir. O gelo cedia rápido demais, e num instinto, Aaron se colocava na frente de Nes. O chão sumiu sob seus pés e ele sentiu a queda. O impacto foi violento. Um som seco, um choque cortante no corpo inteiro. Algo cortou seu rosto, a dor latejante na perna indicava que algo estava quebrado. E a cabeça... Ele piscou, tonto, tentando se manter acordado. O frio mordia sua pele, a névoa ao redor parecia engolir tudo.

Com o grito que escapava dela ainda ecoando, o baque era amortecido pelo corpo de Aaron. Por longos instantes, tudo parecia girar. A destra descoberta ardendo como se a tivesse colocado no fogo, o ombro esquerdo pulsando como se o coração dentro do peito tivesse se deslocado para o local. E então algo úmido e pegajoso alcançava a palma ainda queimando. 

A única coisa que importava era ela. ❝ Nessie... ❞ Ele tentou falar, a voz rouca, quase inaudível.

O som falho, rasgado e doído, era acompanhado da percepção de que o líquido que se esgueirava pelos dígitos femininos era o carmesim espesso do sangue de Aaron. ❝ Ace! ❞ Sacudindo a neblina que se formava entre os ouvidos, Neslihan era acometida por apatia incomum. O talho na tez masculina desprovida de cor era gráfico, bem como a projeção inatural do fêmur e tíbia esquerdos. Algo também não estava certo com a respiração masculina, e a maneira como a pele dele espasmava, adotando uma tonalidade azul, infundia a mulher com a mais pura e corrosiva culpa. Se não tivesse seguido adiante, se tivesse insistido em não fazerem parte daquele show de fantoches que Zafira armara, se não tivesse se atirado na direção de algo claramente perigoso, apenas para sentir a adrenalina da vitória, se tivesse se atentado que o mesmo fenômeno que os permitia visibilidade poderia condená-los, se, se, se. Era tarde demais para pensar neles.

Missing Object : O Broche De Kimberly By : @aaronblackwell & @neslihvns 📍 Monte Cielo - Polizzi Generosa

Ela estava ali, viva. E, por um instante, isso foi suficiente para ele suportar a dor. Aaron nunca teve problema em se jogar em situações de risco. Mas agora, tudo o que ele queria era sair dali. Com ela. Porque, maldição ou não, Nes era uma das únicas coisas naquele mundo que ele não podia perder.

Um soluço quase gutural deixava os lábios, os dentes batendo um contra o outro, e somente então percebia que água gélida escorria pelas paredes ocas do glaciar que os engolira e fazia um atalho até as roupas deles. Aaron parecia ter perdido a luta com a lucidez, o corpo retesado agora sem reação alguma que não a respiração laboriosa. Deslizando pelo gelo como navalha, não mais frágil, sob eles, sentiu o tecido cobrindo os joelhos tensionar e ceder. Com a mão direita escoriada profundamente, tateou pela superfície glacial, desnorteada. Se parasse um segundo sequer, sabia que pânico tomaria o controle e não cederia seu lugar à razão. ❝ Pense, Neslihan. Pense pelo menos uma vez na sua vida! ❞ Vociferando para si mesma, podia sentir a visão turvando com a ansiedade aguda, mas cravando as unhas irregulares, umas quebradas, outras ainda intactas, no joelho exposto, mantinha-se ancorada à realidade.

O peso da mochila pressionava contra o ombro que perdia a sensibilidade, e a espalhava para o restante do braço. A constrição a fazia recordar do kit de primeiros socorros. Quase estourando o zíper na pressa de encontrar algo que pudesse ocupar a mão ainda funcional para que o raciocínio pudesse ser liberado, nem mesmo dava-se conta de que não havia nada no conjunto de suprimentos que poderia ajudar na situação de Aaron, não quando tinha a certeza de fraturas, o corte comprido e espesso demais para qualquer uma das ataduras e um possível traumatismo craniano. A destra lacerada gritava contra a aspereza de tudo que entrava em contato, quando encostou no plástico frio do GPS e celular. Fechando o punho ao redor deles, preparava-se para atirá-los contra a parede de gelo, quando viu a leitura do sinal. Impossível.

❝ Impossível! ❞ A palavra reverberava. Como ela poderia acreditar ser possível, quando há algumas horas, o mesmo aparelho parecera inútil. Poderia ser uma alucinação, ainda que não recordasse de dor alguma na cabeça? Depositando-os sobre o nylon da bolsa, levou os dígitos manchados de vermelho até a raiz dos fios, tateando o local por algum ponto sensível, sem sucesso. Retornando o olhar para Aaron, sentiu algumas lágrimas transbordarem, trilhando um caminho pelas bochechas feridas pelo frio. Com movimentos titubeantes, em descrença e desesperança, teclou 118 nos botões rígidos. Com o primeiro toque, toda a vivacidade ainda presente em seu corpo parecia se esvair em alívio. A voz mecânica não demorou mais do que cinco segundos para responder, mas que mais se assemelhavam a cinco horas. ❝ Aiuto! Ho bisogno di aiuto. Per favore. Siamo caduti e il mio migliore amico è gravemente ferito. Si è rotto una gamba... I-I-penso che abbia un trauma cranico e penso che abbia anche l'ipotermia. Anch'io sono ferita, ma ho solo bisogno che tu lo salvi. Siamo da qualche parte tra Monte Cielo e Monte Vespero. Penso… penso di poterti dare le nostre coordinate esatte, ho un GPS con me. Per favore, sbrigati e salvalo. ❞ ¹ O pedido saía quase em único fôlego, as gotas salobras caindo livremente das pálpebras. Equilibrando o telefone entre a orelha e o ombro saudável, alcançou o Garmin, e ditou exatamente o que prometera.

Assim que as coordenadas deixavam os lábios, e a linha desconectava com a promessa de que tudo ficaria bem, Neslihan retirava sua jaqueta, a colocando sobre Aaron, forçando-se mais próxima dele, na tentativa de passar o próprio calor, ainda que já pudesse ver as próprias unhas tornando-se arroxeadas ao transferir suas luvas para as mãos dele, e temesse machucá-lo ainda mais. ❝ Ace, por favor, não me deixe sozinha. Eu prometo ser uma pessoa melhor, me redimir por ter te causado isso. ❞ As lágrimas passavam a ser copiosas, comprometendo sua visão, fluindo pelo material impermeável e térmico que o cobria. Passeando os dedos pelos fios alheios, repousou a testa sobre a dele. ❝ Por favor, não me deixe sozinha. ❞ A súplica era repetida por centenas de vezes, até apenas um sussurro restar ao ouvir a rotação de hélices em meio à cacofonia dos próprios pensamentos. Com o último resquício de força em si, agarrou o porta joia e o guardou em um dos bolsos da própria calça. A Gökçe vibrava em ódio. Se ela perdesse Aaron por conta daquele maldito broche, daquela cidade infeliz, por conta daquela história de maldição infernal, ela garantiria um destino muito pior do que um século de desamor a todos.

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4 months ago

ㅤㅤㅤㅤㅤflashback : antes da revelação !

ㅤㅤㅤㅤㅤflashback : Antes Da Revelação !

o riso genuíno de olivia era como um pequeno presente , meticulosamente envolto no mais intrincado dos papéis . e a percepção , longe de dissipar-se , apenas intensificava o próprio entusiasmo . por tanto tempo estiveram privadas daquele dinamismo que conheciam com a mesma intimidade da palma das mãos , e neslihan sentira . se fosse honesta consigo , ainda percebia os resquícios do que as afastara insinuando-se silenciosamente em seus sentimentos , no entanto , não era algo em que se permitia delongar , não quando algo muito mais premente as aguardava a cada nova oportunidade . ❝ bom , eu não ficaria impressionada . sei e confio no seu potencial para realizar algo verdadeiramente significativo . ❞ não era mero elogio , tampouco um jogo de palavras . tratava-se da mais pura verdade . embora a boscharino não fosse mais o reflexo exato daquela com quem cresceu — e , graças aos cosmos , ela própria também não — , certas essências permaneciam , imutáveis mesmo diante das inúmeras mudanças , das adaptações , e apesar da forma renovada com que ambas passaram a enxergar o mundo . ❝ eu sabia que uma nova companhia para chanel seria a oportunidade perfeita . ❞ permitindo-se replicar o gesto exagerado de olivia , mas adicionando um sorriso que parecia ter se enraizado em seus lábios , virou-se na direção da estrutura pivotante . ❝ o único desastre , e , francamente , um crime , será se você não se apaixonar por todos eles e quiser levar cada um para casa . ❞ lançou por sobre o ombro , enquanto atravessava a primeira das portas , desviando à esquerda para abrir acesso à sala onde se dedicavam ao enriquecimento ambiental dos filhotes . ❝ e aqui está o mais próximo que talvez possamos chegar do paraíso . ❞ os braços gesticularam para o amplo espaço , organizado em seções por espécie , banhado pela luz natural que entrava através das imensas paredes de vidro voltadas para os jardins . na área externa , os animais mais velhos se entregavam a diversas atividades , salpicando o verde com movimentos cheios de vida. com um aceno cordial oferecido ao par de voluntários no final do recinto , descalçou os saltos , deixando-os displicentemente ao lado da entrada . sem hesitar , apressou-se em direção à melodia suave de pequenos miados que a saudavam da forma mais adorável possível . sentindo a presença da amiga logo atrás , ajoelhou-se , deixando que os dígitos alcançassem o calor delicado de um corpinho felpudo , quase inteiramente branco , não fossem as sutis manchas amarronzadas em uma das patas e o padrão peculiar que lembrava diminutos corações subindo até uma das orelhas . aninhando-o junto a si , ergueu-se , ternura evidente no gesto . ❝ esse aqui é , sem dúvida , o ser mais precioso que já vi em todos esses anos . ❞ murmurando , os lábios curvavam-se de leve . ❝ e se você não sair daqui com ele na bolsa e mais brinquedos do que um filhote poderia precisar, prometo mudar meu nome… mais uma vez ❞ tentava manter o tom sutil , mas o movimento de suas mãos era suficiente para despertar a pequena criatura em seus braços , que abriu os olhos , um verde e o outro azul , e os fixou diretamente nos de olivia .

[ F L A S H B A C K : antes da revelação ]

Deixou que o sorriso de Neslihan se refletisse no seu próprio, mesmo que fosse quase imperceptível. Era impossível não ser contagiada pela energia da amiga, mesmo que mantivesse a fachada de controle absoluto. Enquanto a outra se desfazia de suas camadas de roupa e abraçava o ambiente como se fosse uma extensão de si mesma, Olivia observava cada movimento com atenção calculada, uma habilidade refinada com anos de prática. Era fascinante como a outra parecia genuinamente feliz com algo tão mundano quanto um abrigo de animais. “ Arquitetando futuros improváveis? ” Olivia repetiu com uma risada baixa, girando o copo de café vazio entre os dedos. “ Francamente, isso parece um eufemismo. ” A atitude radiante de Nesi contrastava tanto com o mundo meticulosamente planejado de Olivia que era quase reconfortante – como um lembrete de que nem tudo precisava ser milimetricamente controlado para funcionar. Mas é claro que ela jamais admitiria isso. Quando a amiga mencionou "aproveitar da legião de adoradores", Olivia riu de verdade, um som raro e musical que atraía atenção. “ Ah, claro, minha legião de adoradores! Você sabe que é só eu postar um story de onde estou, que meia dúzia, pelo menos, aparecem aqui, certo? ” Ela deu de ombros, ajustando os óculos escuros agora pendurados no decote da blusa, aquela falsa modéstia que parecia lhe cair muito bem. “ Eu ficaria impressionada comigo mesma se conseguir convencê-los a voluntariar em algo útil. ” Quando ouviu a outra finalmente admitir que se tratava de mais uma de suas "adoções encorajadas", Olivia soltou um suspiro teatral, levando a mão à testa como se estivesse exausta. “ Não seria ruim se Chanel tivesse uma companhia. ” Ela estreitou os olhos, fingindo desconfiança, mas havia um brilho de diversão ali. Gatos costumavam ser independentes, o que era ótimo para Olivia, sempre ocupada e não muito carinhosa, mas a companhia da gatinha lhe fazia bem, mais do que estava disposta a admitir. Enquanto Neslihan indicava as portas do abrigo com uma empolgação quase infantil, Olivia hesitou por um segundo, deslizando os óculos de volta ao rosto como se aquilo pudesse protegê-la de se envolver demais. Não que fosse admitir, mas havia algo na paixão desenfreada de Neslihan que fazia Olivia se sentir... vulnerável. “ Tudo bem, ” disse finalmente, levantando-se com a mesma graça ensaiada de sempre. “ Mostre-me suas pequenas criaturas e me convença de que isso não vai ser um desastre total. ”

[ F L A S H B A C K : Antes Da Revelação ]

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5 months ago

a  percepção  de  mais  uma  batalha  perdida  contra  os  próprios  impulsos  fez  seus  músculos  se  enrijecerem  ,  enquanto  o  estômago  ardia  como  se  atravessado  por  uma  corrente  elétrica  ,  carregando-a  tal  como  um  fio  exposto  ,  vibrando  em  ira  e  vivacidade. seus  pensamentos  ,  tudo  menos  indulgentes  ,  orbitavam  em  torno  da  repulsa  por  sua  falha  e  na  abominação  que  acreditava  encarnar  quando  confrontada  com  as  feridas  emocionais  que  ele  parecia  despertar  com  sua  mera  presença. o  problema  é  você. a  frase  ecoava  em  sua  mente  ,  arrastando-a  para  um  passado  ,  onde  em  sua  infância  os  fios  dourados  se  tornavam  pretos  ,  e  uma  figura  imponente  pairava  sobre  ela  ,  sufocando-a  em  submissão  mental. as  lágrimas  infantis  ,  pequenas  , mas  intensas  ,  alimentando  golpes  emocionais  que  ainda  reverberavam. podia  quase  sentir  o  gosto  salobre  na  garganta  antes  de  sacudir  a  cabeça  ,  dispersando  as  memórias  cáusticas.

seus  olhos ,  ferinos  e  borbulhando  com  animosidade ,  fixavam-se  com  uma  hostilidade  peculiarmente  reservada  à  figura  loira. com  uma  calma  traiçoeira  que  contradizia  a  eletricidade  em  seus  nervos  ,  repousou  as  mãos  sobre  a  bancada. ele  não  merecia  o  privilégio  de  vê-la  vulnerável  ,  nem  a  satisfação  de  perceber  o  ímpeto  visceral  de  estrangulá-lo  que  lhe  aflorava. observou-o  virar-se  com  desdém  calculado  ,  os  movimentos  meticulosamente  ensaiados  ,  enquanto  um  sorriso  enviesado  ,  desprovido  de  calor  ,  curvou  seus  lábios. sua  voz  emergiu  doce  ,  quase  melíflua  ,  mas  carregada  de  um  veneno  que  nenhum  esforço  fazia  questão  de  mascarar. ❝  mais  engraçado  e  fascinante  é  como  você  parece  saber  tanto  sobre  mim  a  ponto  de  formular  uma  análise  tão  detalhada. talvez  devesse  considerar  uma  carreira  em  psicologia  ,  porque  ,  no  direito  ,  sabemos  a  fraude  que  é. ❞  seu  tom  ,  cortante  ,  ecoava  em  sarcasmo.

❝  não  perguntei  sobre  como  brontë  considera  o  amor  uma  força  poderosa  ,  arrebatadora  e  destrutiva  ,  uma  tempestade  que  transcende  as  normas  sociais  e  o  bem-estar  pessoal. nem  sobre  como  shakespeare  o  define  como  complexo  ,  imperfeito  e  intrínseco  ao  ser  humano. muito  menos  sobre  a  visão  de  austen  ,  que  o  interpreta  como  ações  e  não  palavras  ,  respeito  mútuo  e  entendimento  profundo. perguntei  o  que  você  considera  ser  o  amor  ,  christopher. ❞  os  olhos  semicerraram  num  gesto  de  calculada  ironia. ❝  talvez tolstói  seja  mais  do  seu  gosto. ele  o  descreve  como  o  ato  de  fazer  o  bem  ,  a  essência  da  vida  ,  a  fundação  do  mundo  ,  uma  força  universalmente  reconhecível , impossível de não ser compreendida. irônico  ,  não  ?  o  completo  oposto  de  sua  ladainha  vazia. então  ,  diga-me  ,  como  essas  citações  sustentariam  seu  ponto  falho  ?  ❞  as  palavras  eram  carregadas  com  o  desprezo  acumulado  —  passado  ,  presente  e  ,  inevitavelmente  ,  futuro.

❝  descrever  utopias  é  infinitamente  mais  fácil  do  que  vivê-las. o  'amor'  é  um  desejo  fabricado  pelos  que  buscam  preencher  o  vazio  deixado  pela  verdadeira  natureza  humana  —  crueldade  ,  desprezo  e  obrigações  que  nos  afastam  do  que  realmente  queremos. no  fim,  não  passa  de  um  conceito  ,  uma  ferramenta  para  subjugar  em  nome  de  algo  inalcançável. ❞  as  aspas  eram  acompanhadas  por  um  olhar  incisivo  ,  que  estudava  as  reações  alheias  como  um  predador  observando  sua  presa. ❝  ou  talvez  seja  fácil  falar  do  amor  em  ficção  ,  como  tantos  antes  de  nós  fizeram. mas  ,  você  não  pode  descrevê-lo  na  realidade  ,  na  prática  ,  d'amato  ,  porque  nunca  o  sentiu. ❞  girou  o  líquido  rubi  lentamente  no  copo  entre  seus  dedos  antes  de  elevá-lo  ,  canalizando  em  cada  movimento  o  desdém  crescente.

❝  não  sou  eu  quem  se  acha  detentora  de  uma  razão  suprema  para  discursar  sobre  algo  que  nunca  experimentei. essa  é  a  sua  arrogância  ,  não  a  minha. ❞  abaixando  o  vidro  com  delicadeza  ,  permitiu  a  distância  entre  eles  ser  preenchida  pela  tensão. ❝  e não coloco a minha verdade acima da de  ninguém  ,  exceto  daqueles  que  são  moralmente  inferiores  a  mim. isso  se  chama  ter  princípios  ,  deveria  experimentar  tê-los  ,  talvez  assim  criasse  algo  próximo  de  uma  consciência. ❞  era uma dança de  palavras  afiadas como navalhas  ,  cada  uma  estrategicamente  lançada  para  encontrar  brechas  na  impecável  fachada  do  adversário. por  um  instante  ponderou  continuar  com  o  assunto  ou  simplesmente  levantar-se  e  dar  as  costas  ,  quando  a  menção  do  próprio  fracasso  despertou  ódio  em  suas  veias. neslihan  encontraria  a  ferida  de  christopher  e  a  faria  sangrar  como  nunca  antes. ❝  você  é  desprezível. quantas  pessoas  sabem  do  verdadeiro  monstro  que  você  é  ?  ou  prefere  se  esconder  atrás  dessa  empáfia  calculada  ,  apenas  para  evitar  sufocar  por  tudo  que  reprime  ?  ❞  o  gosto  do  negroni  parecia  menos  amargo  do  que  o  que  sua  fala  deixava  no  ar. não  se  tratava  apenas  do orgulho  ferido  ,  mas  a  memória  viva  de  tudo  que  kadir  şahverdi  havia  conquistado  às  custas  de  inocentes  ,  auxiliado  pelos  homens  rizzo ,  era  como  derramar  ácido  em  sua  alma  ,  em  seu  senso. algo  que  o  outro  seria  incapaz  de  desenvolver  nem  mesmo  em  mil  vindas  ao  plano  terreno.

 a  verdade  era ,  de  longe ,  a  coisa  mais  vulnerável  a  se  compartilhar  com  alguém  ,  e  a  sua  a  corroía  em  pequenas  e  dolorosas  doses  ,  não  permitiria  que  ele  tivesse  aquele  tipo  de  influência  sob  si. ❝  um  brinde  à  miséria  ,  d’amato  ,  que  ela  continue  sendo  a  musa  inspiradora  da  sua  eterna  arrogância. ❞  sorveu  outro  gole  elegante  ,  antes  de  repetir  a  saudação  sem  a  mesma  teatralidade. por  uns  instantes  repousou  o  cenho  sobre  os  dígitos  sustentados  pelos  braços  apoiados  contra  a  bancada  ,  como  se  apenas  assim  pudesse  conter  o  caos  em  seu  interior.

A  percepção  de  mais  uma  batalha  perdida  contra  os  próprios  impulsos  fez  seus
A Princípio, A Risada Não Havia Chamado A Atenção De Christopher, Afinal, Haviam Pessoas Demais Ali

A princípio, a risada não havia chamado a atenção de Christopher, afinal, haviam pessoas demais ali e o alvo de riso podia estar em qualquer lugar, porém a voz que se fez audível no segundo seguinte, para seu total desprazer, era de alguém que ele conhecia bem o suficiente para saber que toda aquela ironia contida era dirigida a ele.

Devagar, se virou na direção dela, não fazendo a menor questão de esconder a expressão clara de descontentamento em seu rosto. "Só uma pessoa como você, Gokçe, para achar que alguém precisa ser autoridade para falar sobre algo que, no fim das contas, é inerente a cada ser humano." Sarcasmo se mesclava ao desprezo emoldurando cada palavra pronunciada em seu tom naturalmente calmo enquanto fixava seus olhos no rosto alheio. Para ele, não havia a menor possibilidade de alguém conseguir falar com exatidão sobre o sentimento, afinal, cada um o sentia de uma forma, por isso o amor era retratado de tantas formas diferentes em livros e canções. E era exatamente por isso que o considerava um sentimento tão bonito: pela sua forma de se adaptar.

O indicador circulava a circunferência do copo enquanto ele esperava, da forma mais calma possível, ela falar. Vez ou outra, arqueava a sobrancelha conforme a irônia parecia crescer em suas declarações. Quase soltou um palavrão ao vê-la ajustar a postura, como se ela o estivesse dispensando de uma conversa da qual ela sequer fazia parte a princípio. Em diferentes ocasiões, ele sequer se daria ao trabalho de respondê-la, mas naquele dia ele já havia engolido seu desconforto vezes o suficiente a ponto de se recusar a fazê-lo de novo. Em busca de manter os nervos em seus devidos lugar, Christopher levou o copo aos lábios, sorvendo o restante do whisky em um gole único, e logo após, gesticulou para que o garçom efetuasse a reposição de bebida. Ela podia considerar o assunto encerrado, mas ele não.

"Engraçado como um elogio vindo da pessoa errada é capaz de causar tanto desconforto, não acha?" Comentou em tom divertido, apenas porque sabia que iria incomoda-la ainda mais. Claro que ele sabia que os tais elogios haviam sido feitos de forma sarcástica, mas se recusava a cair na provocação. "Sabe, eu poderia citar trechos e mais trechos de renomados nomes da literatura, músicas de todos os estilos possíveis que falam sobre o amor, mas ainda assim você não iria compreender, porque no fim das contas, o problema não é na existência ou não do sentimento, o problema é você." Agradeceu o garçom com um aceno breve de cabeça ao ter o copo preenchido novamente. "Você que acredita ser tão dona da verdade que quando acha alguém que pensa e age diferente de você já se acha no pleno direito de se colocar como certa." Independente da irritação que sentia, Christopher manteve o tom ameno e os sentimentos devidamente camuflados em uma máscara de tranquilidade que já estava mais do que habituado em utilizar. "Fora que é extremamente engraçado você se achar no direito de falar sobre fracasso comigo, já que visivelmente fica remoendo o seu até hoje." Sim, aquele havia sido um golpe baixo, afinal. ele entendia perfeitamente a frustração que perder algo para uma figura paterna, mas naquele momento pouco importava. Ela até poderia ter sucesso em tornar o dia dele ainda mais miserável, mas ele não se sentiria miserável sozinho. "Cheers to our own misery!" Ergueu o copo como se estivessem brindando e mais uma vez o levou aos lábios, sorvendo um longo gole e então virou-se novamente para frente, decidido a não dirigir a palavra à ela novamente.

A Princípio, A Risada Não Havia Chamado A Atenção De Christopher, Afinal, Haviam Pessoas Demais Ali

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4 months ago
ㅤㅤㅤ‎‎𝐏𝐑𝐄𝐒𝐄𝐍𝐓𝐈𝐍𝐆... A NESLIHAN MOODBOARD !
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ㅤㅤㅤ‎‎𝐏𝐑𝐄𝐒𝐄𝐍𝐓𝐈𝐍𝐆... A NESLIHAN MOODBOARD !

❝ one day she will discover that not even she can hold herself back because her passions burn brighter than her fears !

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5 months ago

ㅤㅤㅤㅤㅤflashback : antes da revelação !

ㅤㅤㅤㅤㅤflashback : Antes Da Revelação !

com um dar de ombros apressado , suspirou , o assunto da mais nova integrante de khadel era um tanto sensível para a gökçe . ❝ estão dizendo que a chegada dela foi o motivo para que todas essas "mudanças" acontecessem . ❞ as aspas saíam em uma entonação levemente enojada diante do assunto , interrompida pelo diminutivo que aaron insistia em relegar a olivia , que a agravava de forma quase instantânea . a linha tênue que ela insistia em andar entre os dois por vezes era exaustiva , dividida entre os polos que a atraíam . era demais pedir que algumas coisas retornassem ao seu estado de origem ? . ❝ uhum , quem provocou quem dessa vez e quem puxou o assunto do passado primeiro ? ❞ o tom era seco , ele sabia do seu posicionamento em relação à dinâmica entre duas pessoas que adorava . ❝ não duvido que está próximo de alguém dar um show por lá , levando em consideração os sentimentos aflorados dessa cidade . ❞ sorvendo o último gole do café e mordiscando mais um pedaço do biscotti , questionou se ousaria pedir mais uma xícara , ou se a agitação em suas veias já atingira o ápice . ❝ não , o meu papel aqui está feito , te atualizei sobre os absurdos rondando por aí , ingeri mais açúcar do que deveria e te fiz dar um sorriso . acho que posso começar o meu dia com o pé direito . ❞ ergueu as sobrancelhas de forma cômica , logo perdendo a batalha contra a própria força de vontade e rendendo-se a mais um ristretto . ❝ e fiz tudo isso antes de você sequer pedir um copo de água . ❞

ㅤㅤㅤㅤㅤflashback : Antes Da Revelação !

Apesar do cansaço, Aaron sorriu de lado com a resposta da amiga. Nes sempre conseguia esse feito com ele, fazê-lo rir de coisas do cotidiano mesmo em meio à rotina puxada. Ao ouvir o nome de Vivianne, o seu interesse aumentou e ele não conseguiu conter a pergunta: "mas, calma, por que mesmo a forasteira está relacionada com isso? Me explica melhor", pediu. Blackwell sentia que muita coisa estava acontecendo na cidade em pouco tempo e era difícil de acompanhar. Quando escutou a última pergunta dela, ele deu de ombros. "O turno? Não sei, acho que foi tranquilo...", mais um movimento incontrolável de dar de ombros. "Sei lá". Ele se recostou na cadeira, cruzando os braços na frente do peito, sentindo o humor azedar só com a lembrança. "A sua amiguinha apareceu por lá. Ela foi para o bar e a gente acabou conversando." A palavra saiu forçadamente indiferente. "Ou discutindo, como você provavelmente chamaria". Ele balançou a cabeça, fingindo cansaço. Ou melhor, fazendo bom proveito do cansaço que já sentia e potencializando isso para a amiga. "Mas, fora isso...tranquilo. Sem grandes dramas no The Loft, thanks God. Pelo menos até a próxima vez que alguém resolver tornar o bar o epicentro de uma peça de teatro." Revirou os olhos, relembrando da cena de Olivia ao lado das amigas. Com um gesto despreocupado, ele voltou a pegar o cardápio que tinha abandonado antes, como se tudo o que dissera fosse só mais uma nota de rodapé no dia. "E você? Alguma outra bomba pra soltar ou essa já foi o suficiente por hoje?"

Apesar Do Cansaço, Aaron Sorriu De Lado Com A Resposta Da Amiga. Nes Sempre Conseguia Esse Feito Com

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5 months ago

o  sorriso  que  surgiu  enquanto  acompanhava  as  reações  de  aaron  às  suas  palavras  irradiava  autenticidade. assim  como  havia  sentido  em  sua  conversa  com  graziella  ,  o  alívio  quase  tangível  de  ter  sua  opinião  validada  por  ele  era  inegável.  em  toda  a  sua  capacidade  mental  ,  não  conseguia  compreender  a  resposta  desproporcional  e  instintiva  que  as  superstições  acerca da  maldição  lhe  provocavam. naturalmente  ,  como  qualquer  mente  racional ,  a  ideia  de  acreditar  em  magia  era  absurda. o  que  escapava  era  a  razão  pela  qual  aquele  mito  específico  a  atingia  de  maneira  tão  visceral. inspirando  internamente  ,  um  riso  suave  escapou  de  seus  lábios  ao  ouvir  a  descrição  carregada  de  acidez  do  blackwell. doenças  mentais  certamente  não  deveriam  ser  banalizadas  ,  mas  a  absurda  natureza  da  situação  exigia  uma  pitada  de  humor  distorcido. ❝  e  a  união  será  oficializada  por  um  psiquiatra  que  também  é  padre  aos  finais  de  semana. ❞  os  olhos  reviraram  em  uma  mescla  de  exasperação  e  ironia  ,  antes  de  concordar  com  veemência. ❝  é  claramente  uma  manchete  sensacionalista. não  me  chocaria  se  fosse  alguma  família  tentando  encobrir  algum  escândalo ,  como  tantas  vezes  já  fizeram. ❞  replicando  a  respiração  masculina  ,  ponderou. ❝  ou  então  ,  alguém  com  algum  tipo  de  questão  em  relação  à  vivianne. não  que  eu  os  culpe  ,  a  essa  altura. quem  quer  que  seja  ,  provavelmente  decidiu  unir  o  útil  ao  agradável  ao  colocar  os  holofotes  sobre  ela. ❞  com  um  olhar  breve  para  a  xícara  quase  vazia  à  sua  frente  ,  solicitou  outra  ,  agora  acompanhada  de  alguns  biscottis  ,  aceitando  mentalmente  que  o  treino  de  tênis  teria  que  compensar  os  carboidratos  excedentes. ❝  estão  dizendo  que  ela  é  a  catalisadora  de  tudo. ❞  meneando  a  cabeça  em  uma  mescla  de  decepção  e  resignação  ,  beliscou  um  pedaço  da  massa  com  amêndoas  ,  suprimindo  um  suspiro  de  prazer  ao  sabor  delicado. ❝  mas  esses  rumores  à  parte . ❞  mudou  o  tom ,  fixando  o  olhar  no  amigo  com  curiosidade. ❝  como  foi  o  turno  de  ontem  ?  alguma novidade no  the  loft  ?  ❞  neslihan  dificilmente  se  colocava  como  o  epicentro  de  boatos  ,  mas  a  perspectiva  de  aaron  sempre  trazia  um  frescor  ao  cenário  que  ela  cuidadosamente  observava  à  distância.

O  sorriso  que  surgiu  enquanto  acompanhava  as  reações  de  aaron  às  suas  palavras

Aaron não sabia dizer muito bem como aquela amizade começou, mas, em algum momento, Nes havia se tornado uma constante tão sólida em sua vida que parecia impossível imaginar o mundo sem ela. Era como se ela sempre tivesse estado lá, assim como todas as tradições que eles passaram a adotar após mais de uma década de amizade. A amiga era uma constante, atravessando as diferentes fases ao lado dele com tranquilidade e, ao mesmo tempo, firmeza. Ela tinha a incrível habilidade de nunca levar seu mau humor a sério demais, como se fosse imune. E, embora ele nem sempre admitisse, havia algo reconfortante nessa dinâmica. "Honestamente?", perguntou, erguendo uma sobrancelha. "Eu não acredito nem um pouco". Aaron se debruçou sobre a mesa, totalmente capturado pela história. Mas ao invés de esperança, só vinha a descrença. "Porque, claro, todo dia a gente vê por aí dois pacientes apaixonados. Isso faz total sentido... Deve ser amor à primeira internação. Maldição quebrada, huh? Aposto que o próximo passo é eles se casarem no refeitório do hospital, logo depois da terapia de grupo." Ele soltou um suspiro cansado, balançando a cabeça. "Isso é só mais uma das mentiras que de vez em quando correm por aqui, aposto o que cê quiser".

Aaron Não Sabia Dizer Muito Bem Como Aquela Amizade Começou, Mas, Em Algum Momento, Nes Havia Se Tornado

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5 months ago

o  sobretudo  cilhando  aperto  sob  a  cintura  era  o  único  sentimento  reconfortante  para  neslihan  naquele  dia . os  sussurros  lhe  arranhavam  os  tímpanos  e  arquejos  esperançosos  como  sal  em  ferida  aberta  ,  um  verdadeiro  pandemônio  para  a  morena  ,  que  ,  ali  ,  mais  do  que  nunca  ,  desejava  ver  khadel  pelo  retrovisor  do  seu  alfa  romeo . exasperada  ,  o  trilhar  dos  saltos  ecoavam  como  o  pulso  nas  têmporas  ,  a  pressão  por  detrás  dos  olhos  indicativos  certeiros  de  uma  enxaqueca  ,  caso  não  se  distraísse  do  circo  de  barbaridades que  a  cidade  havia  se  tornado . ponderava  se  uma  taça  de  vinho  às  nove  da  manhã  seria  tão  mal  vista  assim  ,  afinal  em  algum  lugar  do  mundo  já  se  passava  das  nove  da  noite  ,  quando  os  longos  fios  escuros  de  graziella  adentraram  sua  visão . um  suspiro  em  alívio  passou  pelos  lábios  da  gökçe  ,  um  breve  sorriso  desenhando  as  feições  ,  quando  captou  as  palavras  da  outra  ao  aproximar . ❝  madonna  ,  grazi  ,  até  você  ?  ❞  o  som  que  escapava  a  garganta  era  quase  um  rosnar  . ❝  realmente  acha  que  esse  conto  de  horror  tem  algum  fundamento  lógico  ?  ❞  meneando  a  cabeça  em  incredulidade  ,  voltou  o  olhar  para  o  céu  nublado  de  inverno  ,  os  ombros  caindo  ao  soltar  uma  longa  respiração. ❝  eu  conheço  esse  sorriso… o  que  você  poderia  ganhar  com  toda  essa  insanidade  ,  além  ,  é  claro  ,  de  uma  enorme  dor  de  cabeça  pelas  próximas  semanas  até  uma  nova  traição  ser  descoberta  e  escandalizar  todo  mundo  ao  silêncio  ?  ❞  indicando  com  um  olhar  para  a  direção  onde  seguiam  , envolveu o próprio braço no alheio .

O  sobretudo  cilhando  aperto  sob  a  cintura  era  o  único  sentimento  reconfortante

@khdpontos

WHERE: PIAZZA MONTALDI WHO: Graziella & MUSE ( @khdpontos )

"Dios Mio." O murmúrio em tom de reclamação era evidente dos lábios de Graziella enquanto batia o salto alto no chão da praça. Em qualquer lugar que andava só sabiam dizer somente de uma coisa: os novos seres apaixonados. Até uma matéria no jornal como manchete principal podia ser vista nas mãos de quem lia no banco da praça. "Como o ser humano gosta de se prender na esperança né? Não se sabe falar de outra coisa agora. Se bem que.." A morena parou abruptamente, um sorriso malicioso aparecendo em seus lábios. "Isso pode ser interessantemente maravilhoso ao meu favor."

WHERE: PIAZZA MONTALDI WHO: Graziella & MUSE ( @khdpontos )

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look, i'm planted here, okay? what're you gonna do about it?


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neslihvns - 𝒈𝒍𝒐𝒓𝒊𝒐𝒖𝒔 ! justice
𝒈𝒍𝒐𝒓𝒊𝒐𝒖𝒔 ! justice

𝒕𝒉𝒆 𝒂𝒄𝒕𝒊𝒗𝒊𝒔𝒕 ! neslihan gökçe , 29 , human rights lawyer . can you hear my heart beating like a hammer ?

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