"Pode até ser, mas até dentre as sensações das emoções existem diferenças. Mesmo que eu consiga entendê-las mais facilmente, não existe um padrão, por exemplo, de felicidade ou amor. A forma como você sente amor não é a mesma forma como eu sinto amor, entende?" Entendia o que Kitty desejava dizer, mas decifrar emoções era diferente de decifrar pessoas. Quando lia as emoções alheias, mesmo que não intencionalmente, elas carregavam muito sobre a forma como os outros permitiam sentir, ainda mais quando elas misturavam-se a ponto de não saber onde cada uma começava e a outra terminava. Não sabia muito bem como explicar, mas já tinha observado casos onde a felicidade carregava culpa e a tristeza carregava apreciação. Na maioria das vezes, havia mais complexidade do que simplesmente o preto no branco. Observou a outra tomar um drink da bebida, um sorriso aparecendo nos lábios ao perceber que talvez fosse um pouco forte demais para o que estivesse esperando. Não que tivesse problemas com álcool, mas Anastasia já estava acostumada com o sabor e as diferenciações, mesmo que continuasse não apreciando, por exemplo, whisky e suas variações em drinks. "Posso perguntar qualquer coisa? Eu tomaria cuidado com isso. Todos nós temos segredos." Os olhos delas brilharam com aquela nova opção, pensando que poderia ser o suficiente para que pudesse provocar alguma reação que não era tão comum na filha de Hades. "Já? Mas você tomou poucos goles. Como você é bêbada? Agora quero saber."
O som das unhas de Anastasia chamaram atenção de Kitty, que olhou para as unhas, os dedos e então para o rosto dela, confusa. "Não acho torturante. A maioria das pessoas passa por isso todos os dias. Nunca sabemos o que o outro está pensando ou sentindo. Por isso as pessoas são interessantes, porque precisamos desvendá-las." Comentou, mas apesar de discordar dela, tentou se imaginar sem seus poderes. A geocinese fazia parte de seu ser. A ligação com a terra a acompanhava a todo momento, uma ligação sem fim. Era capaz de sentir tudo através do solo e imaginava que perderia um sentido se não fosse mais possível sentir. Havia um desequilíbrio se não pudesse mais contar com seu poder, então Kitty se curvou em direção à loira, um sorriso começando a aparecer em seus lábios. "Vamos, o que quer saber? Pode me perguntar, não tenho segredos." Bem, tinha alguns, mas não achava que Nastya se aproximaria deles. Parecia improvável. Kitty levou o drink a boca novamente, ignorando a piscada dela que a fez corar. Conseguiu ingerir sem fazer uma careta, o que considerou como uma vitória. Ainda assim, sentia o líquido quente pela garganta, arranhando de maneira desconfortável. Kitty até bateu as taças com ela e tomou mais um pouco, porém decidiu que três goles eram o suficiente. O bastante. Forte demais para o seu gosto delicado, portanto empurrou o drink de lado, balançando a cabeça. "Acho que é o bastante para mim. Já experimentei, não quero ficar bêbada. Não vai querer que eu fique bêbada do seu lado." Havia ficado uma vez só, uma lembrança lamentável que não pretendia repetir de maneira alguma, ainda mais em um baile elegante.
ʚ ROSE BOMB . inside my reddened heart burns up and makes me dance !
Como uma boa patricinha que é, Anastasia não permitiria que sua arma fosse qualquer outra coisa além de ouro imperial. Todas as suas outras armas são do mesmo material, então era esperado que desejasse seguir o mesmo padrão. Imagina se uma fosse dourada e a outra prateada? Acabaria com todo o seu aesthetic. Para a semideusa, não havia outra escolha além do ouro imperial e brigaria com quem fosse necessário para garantir que o seu desejo se tornasse uma ordem.
Precisava de uma arma que suprisse a necessidade do que estava fazendo no seu arsenal. Odiava arco e bestas, no entanto, então jamais foi uma opção válida para ela, mesmo que alguns tivessem insistido que talvez fosse uma boa ideia. Desde que se conhecia por gente, o balanço não fazia o menor sentido para ela, então precisava de algo que se identificasse. Por isso, escolheu uma pistola mágica que disparava balas de bronze celestial: rápida, precisa, imprevisível e dramática.
Sobre os aspectos mais específicos em relação à aparência, ela serve para complementar o resto do seu pacote. Dourada, com detalhes em rosé gold entalhados ao longo do metal da arma, que conferem a mesma personalidade que Anastasia deu às demais armas. São obras de um conjunto que refletem completamente a personalidade da filha de Afrodite, que prefere que até mesmo a letalidade contenha a beleza inerente.
A arma e os projéteis permanecem como anéis dourados em seus dedos, que podem ser facilmente puxados em caso de urgência. No entanto, uma vez que o revólver é acionado, é necessário recarregar manualmente com as balas, o que pode demorar um pouco mais em comparação a outras armas.
❛Just keep looking at me. No one else matters.❜
FLASHBACK . As noites sempre eram piores. Quando fechava os olhos, parecia sempre estar sendo engolida novamente para a escuridão que envolvia os pesadelos que teve. Mesmo que possuísse agora a bênção para protegê-la, Anastasia não acreditava que era o suficiente. Os sonhos ruins jamais paravam e era por isso que, na maioria das noites, sempre entrava silenciosamente no chalé de Bóreas para dormir com Santiago. Havia algo sobre a presença do amigo que tornava os pesadelos mais suportáveis, mesmo que temesse que jamais fossem a abandonar. Novamente, tinha acordado sem ter certeza de onde estava. A respiração estava ofegante, levantando-se da cama como se ela estivesse infestada com as cobras com as quais estava sonhando. Podia praticamente senti-las deslizando pelas pernas e pelos braços, desejando ter um pouco de Anastasia para si, infestando e provando. Escutava os chocalhos e os chiados das serpentes, que tinham se tornado parte intrínseca das noites dela. Mal tinha notado que estava chorando encolhida em um canto do quarto até notar a aproximação do amigo, tirando-a das lembranças que pareciam dilacerar o peito de dentro para fora. Subiu o olhar e focou no rosto de Santiago. Ali, encontrou um pouco da calmaria de que tanto precisava e esqueceu dos pensamentos que a levavam para a caverna novamente. Em um gesto familiar e natural para a filha de Afrodite, permitiu se afundar no abraço dele para que se lembrasse de onde estava. Com quem estava. Afundou os dedos nas costas alheias, a cabeça apoiada como se tivesse medo de soltá-lo e ser transportada para o pesadelo novamente. Ele era real. Ela era real. Agarrou-se ao aroma dele, à sensação dos braços ao seu redor e à voz que parecia carregada de preocupação. As lágrimas não escorriam mais pelo rosto e os chiados não eram mais tão altos a ponto de sequer conseguir pensar. Quando finalmente se afastou, deu um suspiro e um pequeno sorriso apareceu nos lábios dela. "Eu estou bem."
"Sempre tem uma primeira vez, não acha?" A estratégia da Anastasia sempre era mais ofensiva, fosse nas palavras ou durante um combate verdadeiro. Não era uma pessoa que permanecia no seu canto, até mesmo quando escolheu a arma favorita. Tinha uma teoria que combatentes que utilizavam espada eram geralmente arrogantes demais para esperarem, confiando que as habilidades seriam necessárias. Mesmo que não fosse boa como uma filha de Ares, acreditava que Sharp Beauty lhe dava o perfeito equilíbrio naquelas situações. "Isso, mas eu não me entregaria. Sabe, não estou muito no mood." Um sorrisinho debochado apareceu nos lábios da filha de Afrodite, ainda caminhando tentando não produzir um barulho de passos. Abaixou-se o suficiente para que conseguisse pensar se estava escutando alguma coisa, mas não estava dando muita sorte. "Está com medo, irmão? Não sabia que gostava de ficar se escondendo ao invés de vir me atacar." A provocação saiu dos lábios da mulher naturalmente, mesmo que, no momento, também estivesse escondida. A voz era alta o suficiente para que ecoasse pelo ambiente, o que esperava que impedisse a identificação do local exato em que estava.
⭒ ๋࣭ 𖹭 ๋࣭ ⭑ as ruínas antigas eram incríveis para se esconder, o cenário proposto pelo jogo fazia com que se tornasse mais incessante pois as rochas eram grandes o suficiente para lhe ocultar ali no campo. a arma estava a postos, maxime tinha as costas contra uma plataforma rochosa firme que o mantinha seguro da mira da irmã. se havia uma coisa que aprendera ali era que o espírito competitivo dos filhos de afrodite era imenso. já sabia que tinha esse problema, mas isso aumentou quando se viu diante da perspectiva de ter que disputar contra anastasia. “ ━━━ desista você, mon cher. desistir não é uma palavra que eu conheço." declarou logo, os ouvidos bem atentos tentando identificar de onde vinha a voz dela. “ ━━━ pelas minhas contas cada um de nós tem mais uma chance, não é? uma vida cada. por que você não acaba logo com isso e se entrega?"
Inclinou o tronco, ignorando por um momento a existência da cicatriz no rosto. Mesmo que soubesse que permanecesse lá, Anastasia estava fazendo o seu máximo para não pensar a respeito dela. Isso até o olhar do Aidan cair sobre ela, o que fez com que se irritasse ainda mais. Não era uma pessoa desagradável, pelo menos acreditava nisso, mas tinha um temperamento forte, principalmente quando não conseguia o que queria. A garganta fechou por um segundo, pensando que talvez todos pensassem que o rosto dela estava sendo destruído. Assim como o semideus, tinha recebido diversos olhares, mas não atreveu entrar nas mentes para identificar sentimentos. Só as probabilidades já a deixavam enjoada. "Você vai fazer o que eu te pedir, então? Posso ser insistente e me aproveitar disso." Os olhos brilhavam provocativamente, mas Anastasia sabia que não teria coragem de fazer qualquer coisa com alguém que odiasse, como era o caso dele. Depois do baile, quando teve que afastar Kitty para que não visse a ceninha dele, o desgosto tinha apenas aumentado. Não via o apelo em Aidan, sendo apenas mais um homem com small dick energy. "Eu nunca começo pela parte boa, querido." Conectou com a mente dele facilmente, não sentindo nenhuma resistência no laço formado. Através dele, explorou levemente os sentimentos que o atravessavam, por simples curiosidade, mas logo começou a enviar informações. Não sabia exatamente o que ele pensaria, mas pensou nas cores e na sensação de medo, da mais pura forma. Intenso demais, mas não que fizesse com que ele saísse correndo. Era o tipo que te plantava no lugar, sem saber o que fazer ou que não conseguisse pensar muito bem. Observava com atenção as reações alheias.
Todo arrumadinho? Aidan estava destruído. Não dormiu bem nos últimos dias, a barba já estava mais aparente no rosto, não havia sentido fome e tão pouco desejo de fazer seus gracejos por aí. Ainda possuía o aspecto físico que adquiriu no dia do baile, é claro, mas sentia-se um saco de batatas perante o mundo. A voz de Anastacia atraiu sua atenção, um olhar de pesar ao ferimento que se encontrava no rosto da semideusa e que, de forma reduzida, ele também possuía. Soltou um riso, um tanto sem graça, e desviou o olhar. "Gostei da modéstia, cupidinho." Respondeu passando a mão pelo rosto, buscando despertar do sono repentino que o atingia naquele momento. A cicatriz sendo esticada na pele, uma fisgada incômoda. "Todos sabem que eu tenho um probleminha com a sua laia. Não entendo o motivo da sua surpresa." E de fato, a familiaridade de Aidan com os filhos de Afrodite era motivo de piada no chalé cinco, já que era um pedido fluir desyes semideuses que o filho de Ares, mesmo relutante, obedecia como um cão fiel. Características herdadas do pai, talvez, mas que lhe rendeu muitos momentos cômicos pelo acampamento. Consentiu com a cabeça, levantando-se do banco para tornar a se aproximar dela. "Vamos começar pela parte boa ou vamos pela parte péssima de novo?"
ʚ com @sonofthelightning .
ʚ em chalé de afrodite .
Os olhos reviraram, olhando para o trabalho feito pelo filho de Zeus, que não estava em nada com o que ela tinha mostrado para ele. Talvez geladeiras realmente não fossem boas com trabalhos manuais. "Você nunca me escuta." A frustração saiu facilmente de Anastasia, que estava tentando ensinar Ian a fazer cartões decorativos para presentes. Mesmo que não fosse a melhor naquilo, tinha orgulho de como sempre pareciam mais caros e chiques do que realmente eram, principalmente devido ao esforço que colocava em cada um. Na frente dos dois, havia várias opções de cores de papel, assim como inúmeras fitas que continham um pouco de glitter. Na opinião da filha de Afrodite, frufrus nunca eram demais. "Vamos lá. Você precisa escrever algo diretamente do seu coração no cartão e, quem sabe, colocar um pouco de brilho para deixar mais bonitinho." As mãos pegaram um cartão em formato de coração, vermelho, e com leves brilhos dourados, os olhos arregalando em direção ao semideus, desejando provar um ponto. Escreveu um simples 'gosto muito de você' em letras cursivas e, então, mostrou para ele o resultado final. "Esse é um conhecimento que você precisará ter eventualmente, ok? Vai que você encontra mais uma namoradinha ou namoradinho que, por alguma benção que garanta muita paciência, vai aguentar sua personalidade terrível."
ʚ com @aguillar .
ʚ em ofurô (spa) .
Uma risada escapou dela naquela situação, mas logo ficou séria novamente. Estava acostumada com a proximidade com o semideus, então estar tão próxima enquanto permanecia concentrada enquanto passava a máscara que havia achado ali no SPA não causava nenhum estranhamento na filha de Afrodite. Talvez por terem passado tanto tempo juntos, a interação parecia completamente natural. "Fique quieto, estou terminando." A mão dela trabalhava sobre a superfície da pele, enquanto ambos estavam envolvidos pela água quente. Estava precisa daquilo, relaxando enquanto sentia as bolhas estourarem em contato com a sua pele. Só de estar na ilha parecia que o humor já tinha melhorado, uma vez que, desde os últimos acontecimentos, parecia que a cabeça parecia constantemente envolvida nos piores pensamentos possíveis. Massageava levemente o rosto do semideus, tomando cuidado com cada um dos lugares. Os lábios estavam curvados naturalmente para cima, demonstrando a leveza que o corpo dela estava experimentando. "Você não está se sentindo melhor aqui?" Uma risada escapou de Anastasia, tomada por aquele momento. Ignorava qualquer resquício do sofrimento que tinha, pensando que era um assunto para a mulher durante a noite, quando estivesse tomada pelos pesadelos. Precisava aproveitar aquele momento, porque parecia tão raro estar sentindo-se como Anastasia novamente.
Já tinha visto o Santiago irritado anteriormente, principalmente devido à convivência que tiveram ao longo dos anos. A amizade deles tinha sido fortalecida por conta daquele vínculo, sabendo que ambos podiam confiar um no outro, independente do que acontecesse. O afastar do outro fez com que o peito doesse, sabendo que tinha errado assim que viu a expressão no rosto alheio. Sabia que não era fácil, mas talvez fosse por melhor. No entanto, se aquele era o caso, não deveria estar se sentindo melhor? A ausência da mão alheia, um gesto que era tão natural para eles, parecia criar mais uma barreira entre os dois. Não queria perdê-lo, mas, naquele momento, parecia inevitável. Sentia-se uma tola por ter se permitido chegar tão longe, ainda mais quando havia tanto a se perder. Tinha prometido, no fim do último relacionamento, que não desejava passar por aquilo novamente. Os olhares magoados, as palavras cheias de rancor... Não deveria afetá-la novamente. Anastasia tinha colocado em sua mente que era quebrada demais para permitir ter afeto daquela forma. Ainda assim, estava ela ali, na mesma posição em que pediu aos deuses para não colocá-la novamente. O medo fazia com que o bolo na garganta se formasse.
Abriu a boca e a fechou novamente, sem saber ao certo o que dizer. Então, permitiu que ela abrisse, porém nenhum som foi produzido. Estava desnorteada com as palavras alheias. A proximidade dele, quando estava sentindo a respiração alheia contra o próprio rosto, foi a tortura que não esperava enfrentar, ainda mais quando absorvia os sentimentos que a inundavam. Era incapaz de enfrentar aquele tormento quando estavam tão perto. Ao olhar diretamente para ele, no entanto, via a mágoa contida, muito além das palavras. Não precisava entrar em sua mente facilmente para compreender aqueles sentimentos. Fechou os olhos, absorvendo cada aroma, cada golpe, cada emoção. Talvez merecesse isso, tinha sido egoísta de novo, mesmo quando prometeu que não o faria. Quando ele fez o mesmo gesto que tinha feito anteriormente, quando estavam no ofurô, o cenho dela franziu suavemente, sendo invadida pela preocupação novamente. Não buscaria pela mente dele; sabia que encontraria aquela barreira que conheceu e desaprovou. Queria saber mais, mas não estava em posição de questioná-lo sobre o assunto. Deu um passo como se quisesse ajudá-lo, a mão levantando em instinto, mas sabia que Santiago não queria sua proximidade. Talvez isso a magoasse ainda mais: saber que não poderia simplesmente abraçá-lo até que aquilo não fosse mais um problema. "Não estou me justificando." As palavras saíram de forma hesitante, sabendo que era um péssimo começo para o que estava prestes a dizer. "Você acha que é simples para mim?" A voz dela saiu mais baixa do que queria, quase um sussurro, mas carregada de emoção. "Eu sou um caos, Santiago. Não quero que você tenha que enfrentar isso, porque nem mesma eu sei como fazer." Mordeu o lábio, enfrentando novamente o bolo que se formava na garganta. Tinha lutado contra si mesma durante toda a vida: quando o pai morreu, quando vivenciaram a primeira missão, quando foi ferida tão gravemente que o rosto continha aquela maldita cicatriz.
"Nunca foi minha intenção que você se sentisse assim." Era difícil encará-lo naquele momento, mas Anastasia fazia o melhor que podia. As palavras saíam tropeçadas da sua boca, como se temesse perdê-las a qualquer momento. Mesmo que tivesse a intenção de que se afastassem durante o tempo que ficou sumida, parecia que tornou toda a situação ainda mais difícil de ser explicada. Para ela, fazia todo sentido, já que seria mais fácil. Era uma grande medrosa naquele aspecto. Sabia que era uma desistente, mas não confessaria em voz alta. "Pelos deuses, acho que me importo tanto com você que dói." Controlou a vontade de segurar na mão dele, para que compreendesse através dos gestos a intensidade do significado dele para ela. "Nunca quis que você sentisse que eu não me importava com você, que eu estivesse brincando com você ou te torturando para o meu próprio prazer." Ele era a sua família. Mais do que qualquer coisa que eram ou que poderiam ser, não ansiava que ele fosse apenas passageiro. Precisava que ele ficasse, mas, ainda assim, parecia egoísta da sua parte falar que queria aquilo. Santiago merecia mais do que Anastasia. Foi quando decidiu agachar-se em frente à poltrona em que ele estava sentado, permitindo que os olhares se encontrassem novamente. "Me afastei porque pensei que seria mais fácil. Que, se eu desaparecesse por um tempo, você poderia viver sem o peso do que eu sou e do que eu não posso ser." Tinha dificuldades em enfrentar os problemas verdadeiramente. Poderia ser uma lutadora exímia, mas continuava batalhando com os demais problemas. Os relacionamentos antigos tinham demonstrado o quanto era difícil ter que enfrentar as consequências do poder e, acima de tudo, a realidade da própria mente, que parecia a vontade de pregar peças constantes em si.
O encaixar da mão de Anastasia na sua foi quente e familiar. Mesmo com toda a mágoa e a animosidade que vinha alimentando, não podia mentir a si mesmo: tinha poucos confortos em sua vida, e aquele era o único que persistia até então. A pele delgada na sua, tão perto e tão longe–em outra situação, o toque por si só o teria feito relaxar, mas naquela em particular seus ombros se enrijeceram em resposta. Talvez fosse por isso que o dilacerasse tanto sentir a distância que se abria entre os dois como um abismo, quando as meras migalhas de afeto que coletava em momentos furtivos como aquele eram mais que suficientes. Nunca havia se permitido pedir por mais, e o pouco que tomava para si ainda era mais do que ela estava disposta a ofertar. Entendia, pois nada tinha a oferecer em retorno, mas não sabia como o aceitar.
Seria tão fácil a puxar para si. Tão fácil calar suas mil e uma dúvidas com um beijo–mas então viriam as perguntas e a incerteza, e o silencioso amaldiçoado lhe roubaria até mesmo o pouco que agora era nada, pois nunca seria capaz de dizer as três palavrinhas usadas desde que o mundo era mundo para explicar o que sentia por ela.
Afastou os dígitos dos dela como se estivessem em chamas, pois não podia se dar ao luxo de a querer com tanto afinco quando a sentia prestes a descartá-lo. Como em resposta ao que sentia, a brisa gelada do Norte soprou por entre a janela entreaberta, um sinal que ela saberia ler porque o o conhecia como ninguém: estava tentando e falhando em se controlar. ʿ Agora você quer conversar ? ʾ Questionou, o tom afiado como uma lâmina ao se permitir estacar onde estava. Seria fácil interpretá-lo de maneira errada, escolher rotular o destempero como raiva e o colocar na mesma caixa de sempre, mas o gelo em seus olhos pareceu derreter quando por fim se permitiu a encarar. ʿ No. You don't get to do that. ʾ A informou quase em uma acusação, pronto para deixar claro o quão insignificante ela o havia feito sentir ao ignorar sua existência mesmo com todas as tentativas de se reaproximar. ʿ 'Confusão' não é justificativa para me jogar no lixo como um brinquedo quebrado. ʾ Prosseguiu, dando um passo e outro na sua direção, se inclinando para diminuir a diferença de altura até que seus narizes estavam a centímetros de se tocar. ʿ O que caralhos tem de tão confuso afinal ? ʾ A amargura na pergunta era palpável, pois lhe doía a ver permitir que a incerteza a respeito do que quer que fosse afetasse a única constância com a qual sempre haviam contado: um com o outro. ʿ You're not the only one who's suffering. You don't get to torture me for sport when you know... ʾ Pareceu tropeçar nas próprias palavras, interrompido pela dor lancinante que vinha toda vez que sentia seu coração empedrar–censurado pela deusa do amor, que se divertia ao castigá-lo. Anastasia não sabia, não realmente–não fazia ideia de como ele se sentia, e Santiago nunca lhe poderia contar. Levou a mão ao peito como se atingido por um golpe invisível, e recuou até se apoiar sobre o braço da poltrona vazia, parecendo quase impossível se manter de pé sempre que a maldição decidia lhe visitar.
Aceitou sua derrota e se acomodou de volta no assento, a respiração acelerada pouco fazendo para ajudar a encher seus pulmões de oxigênio quando mal parecia capaz de fazer o próprio peito subir e descer. Mesmo com a dor lhe partindo, tentou lhe dizer com o olhar tudo o que não podia o fazer com palavras. Se ela estava confusa, só o que tinha a oferecer em resposta era a certeza de quem sabia, desde a primeira risada que lhe roubara, que sua presença se havia tornado uma necessidade tão básica quanto o ar. ʿ You don't get to ask how I'm doing after you've shown me how little you care. ʾ Foi o melhor que conseguiu dizer, o mais próximo da verdade que era capaz de chegar. A voz foi quase um sussurro, como se envergonhado ao pronunciá-lo pois significava admitir, de maneira incontestável, que tudo o que queria era saber que ela se importava.
Estava exatamente como ela o havia deixado na última vez que estiveram juntos: Sozinho e ferido. Já não tinha como o ocultar.
BIRDS of a feather .
trigger warning : morte && dor física .
Sentiu como se tivesse um peso que subia na cabeça e ia descendo para as pernas. Precisou piscar algumas vezes para identificar aquele lugar, principalmente porque estava em um passado tão obscuro que armazenou em uma parte da mente que não poderia ser facilmente acessada. Ali era onde os pesadelos começaram, quando tudo que poderia fazer era sentir as lágrimas escorrerem pelo rosto toda vez que sequer pensava no antes do Acampamento Meio-Sangue. Ela gostaria de ter tido mais tempo, mas estava novamente na mansão da família, embaixo da mesa que tinha visto o pai morrer. A respiração ficou pesada, o ar tornando-se difícil de entrar, mesmo que ofegasse. Tentava não pensar naquele momento, na falta que o pai fazia, já que, antes de ser reclamada e finalmente ser curada dos traumas, tudo que sentia era uma saudades que doía o peito. O luto destruiu Anastasia, a criança que tinha um pouco de chance de ser doce. Quando o genitor morreu, não havia mais nada para ela naquele mundo e, por muito tempo, acreditava que seria melhor desistir do que continuar vivendo.
Não era mais uma criança indefesa, no entanto. Tinha experimentado o mundo e, acima de tudo, lutado para que ganhasse e achasse o seu espaço. Os olhos não enchiam-se mais de lágrimas como antigamente e não havia mais um constante pesar nos ombros que impediam de prosseguir. Estava saindo debaixo daquele lugar quando sentiu o cheiro de sangue, repulsivo como lembrava. As mãos começaram a tremer inconscientemente e fechou os olhos com força, voltando-se ao lugar onde estava. Conseguia sentir a perna ficando molhada com o líquido vermelho, mas se recusava a encarar aquilo. Sabia a cena que encontraria: o corpo do pai, os olhos gentis e, ao mesmo tempo, aterrorizados com o fim que estava tendo, mas com um sorriso ao perceber que a filha não sairia do esconderijo e, assim, ficaria bem. Camada por camada, de indiferença para raiva para deboche, blindava-se da capacidade de expressar o que sentia e desenvolver vínculos afetivos com qualquer um. Era uma armadura que impedia que amasse e permitisse ser amada. Mesmo que os pesadelos jamais tivessem indo embora, encontrou forças na própria dor para que conseguissem seguir em frente minimamente. O que a assustava de vez em quando era perceber como esquecia aos poucos o tom exato do azul dos olhos do pai, assim como onde estavam as covinhas que tanto invejou e queria ter herdado. Não queria esquecê-lo e, por mais que tivesse uma foto ou outra, as lentes jamais capturavam corretamente o que ansiava saber. Ela não queria que a vida com o pai se tornasse apenas um fragmento.
— Nastya? Estamos aqui. — Escutou a voz de Maxime, o que fez com que abrisse os olhos novamente. A mesa tinha desaparecido, mesmo que continuassem na mansão. Não havia mais sangue, o que era estranho. Talvez tivesse imaginado aquilo. Como que tinha parado ali, de qualquer forma?
Um sorriso apareceu nos lábios dela, naturalmente feliz em encontrá-lo novamente, já que tinha sido uma das principais pessoas a fazer com que passasse pela sua fase nebulosa. Os olhos escaparam para as pessoas atrás dele, observando Bellami e Christopher, e ficou um pouco confusa do porquê todos estavam em sua antiga casa. Um carinho imediato invadiu o coração dela, já que aquela era sua família. Depois de tudo que tinha acontecido no passado, tinha achado novamente pessoas que poderia chamar daquela forma e que nutria um amor incondicional. Faria qualquer coisa por eles, independente do que fosse e sem nenhuma hesitação. Aceitou a mão estendida do conselheiro, pronta para ir embora do lugar que trazia memórias mistas em sentimentos. Queria chorar para ele e contar de como os pesadelos tinham sido desencadeados. Estava pronta para falar para todos irem embora juntos, a boca abriu, mas o som que foi escutado não era de sua voz.
Escutou o som que perseguia os pensamentos bloqueados, um grito que fazia com que acordasse quase todas as noites com um solavanco. Ele pareceu preencher cada canto da sala de estar e sabia que não tinha por onde escaparem.
Não era mais fraca, não tinha mais medo. Puxou a espada sem nenhuma hesitação. Pensava no pai e que, se tivesse a mesma habilidade que tinha atualmente, nada de ruim teria acontecido. Ela era boa. Ela era a melhor. Ainda sim, havia uma pequena parte de si que fazia com que o coração batesse aceleradamente e sentisse o interior chocalhar com uma ansiedade iminente. Segurou a espada mais forte, apontando em direção que o grito vinha.
— Podem ficar tranquilos. Sou incrível, acabo com ela em questão de segundos. Se quiser sentarem e observarem o show. — A voz saiu de forma bem-humorada e confiante, repleta da arrogância que, quem convivia com Anastasia, sabia que poderia facilmente enganá-la em um momento importante.
Tinha desenvolvido aquela personalidade depois de anos acreditando que não merecia nada do que tinha, já que havia perdido o que importava. Havia permitido que perdesse. Precisava não sentir como se fosse um eterno peso e, quando não teve mais aquele sentimento, uma nova filha de Afrodite foi colocada em seu lugar. Confiante, cheia de si, arrogante. Várias formas de encarar o mesmo objeto de estudo.
A harpia, no entanto, desprezava a peça de ouro imperial que Anastasia apontava para ela. Parecia simplesmente ignorar a presença da semideusa, os olhos presos nos irmãos. Tentou chamar a atenção dela com um grito, mas não foi o suficiente. Cansada daquilo, o corpo preparou-se para um ataque, então... Nada. Os irmãos pareciam despreocupados, já que a Bragança tinha prometido que protegeria eles. Por que deveriam se preparar para uma batalha no qual ninguém havia os chamado? Tentou mais uma vez, mais outra, porém as pernas pareciam imóveis, como se tivessem coladas no chão. Queria correr em direção a ela e mostrar o quanto era capaz de proteger as pessoas que amava, mas perdia as esperanças aos poucos. Quando a harpia finalmente levantou voo, os olhos claros arregalaram-se no mais profundo desespero e, antes que pudesse pedir para que se preparassem ou corressem, o monstro avançou neles impiedosamente.
Não duraram segundos e tudo que pode fazer foi observar. Os braços pararam de se mover, assim como as pernas. Tudo parecia rígido, mesmo que os olhos se movimentassem de um lado para outro, sendo obrigada a assistir aquilo. Assim que tudo acabou, a harpia pareceu decidir que já estava satisfeita e voou para longe. Nos rostos dos irmãos, a expressão acusatória e traída permanecia, já que tinha pensado mais em si do que neles. Como tinha permitido que não ajudassem? Como poderia não tê-los protegido? Novamente, estava sozinha, sem família. Caiu de joelhos, as lágrimas invadindo os olhos como não acontecia fazia muito tempo. A família que tanto amava, que tanto tinha construído, não restava mais ninguém.
Estavam todos mortos e era culpa de Anastasia.
Ela era fraca.
Fraca.
Fraca.
semideuses citados : @maximeloi && @thxbellamour && @christiebae
@silencehq